Avaliadas a primeiras medidas conhecidas é caso para dizer que estamos perante uma revolução no mercado de habitação e arrendamento. O governo começou a anunciar a 16 de fevereiro de 2023 um conjunto de medidas que podemos apelidar de revolucionárias em várias vertentes do mercado de habitação.
Os impactos são vários. O Estado asssumir-se-á como garante de rendas perante os senhorios, criará um regime fiscal muito mais favorável para o arrendamento para habitação permanente e, em especial, para imóveis em rendas acessíveis. Por outro lado, haverá novos apoios às famílias em dificuldades, mudanças no crédito à habitação. Haverá também medidas de apoio à migração de imóveis do alojamento local para o arrendamento, bem como intervenção direta do Estado a mobilizar imóveis devolutos forçando a que estes sejam colocados no mercado de arrendamento. Há ainda várias medidas de combate à especulação imobiliária, seja quanto à habitação pública, seja quanto às regras para construção, seja ainda na definição dos valores das rendas que passaram a ter limites, mesmo nos novos contratos.
Haverá ainda medidas de reconversão de imóveis que não estão afetos a habitação e que poderão passar a estar e ainda medidas de apoio aos municípios para terem um papel mais ativo e recursos para o fazer, neste mercado.
Neste artigo iremos dar destaque às principais medidas já conhecidas.
IRS com descidas na taxa liberatória:
- Taxa liberatória sobre rendimentos de rendas desce de 28% para 25%;
- Bonificações na taxa de IRS reforçada face à lei atual descendo de 23% para 15% para contratos com duração entre 5 e 10 anos;
- Para os contratos entre 10 e 20 anos passa de 14% para 10%;
- Para contratos superiores a 20 anos a taxa passa de 10% para 5%.
- Em suma:
- Regime atual:
- Redução na taxa com base na duração do contrato:
- (i) Até 2 anos: 28%
- (ii) Entre 2 e 5 anos: 26%
- (iii) Entre 5 e 10 anos: 23%
- (iv) Entre 10 e 20 anos: 14%
- (v) Superior a 20 anos: 10%
- Redução na taxa com base na duração do contrato:
- Regime proposto:
- (i) Até 5 anos: 25%
- (ii) Entre 5 e 10 anos: 15%
- (iii) Entre 10 e 20 anos: 10%
- (iv) Superior a 20 anos: 5%
Comunicação do contrato do arrendamento – Imposto do Selo
- Regime atual:
Comunicação apenas pode ser feita pelo senhorio. - Regime proposto:
Comunicação passa a poder ser feita pelo arrendatário nos casos em que não
seja feita pelo senhorio no prazo legal.
Aumentar a oferta de imóveis para habitação;
- Converte o uso de imóveis de comércio ou serviços para uso habitacional:
- Possibilidade de alterar automaticamente uso de imóveis de comércio ou serviços em imóveis para habitação – sem necessidade de revisão de planos de ordenamento do território ou da licença de habitação –, desde que a custos controlados.
- Disponibilizar imóveis do Estado em regime de Contrato de Desenvolvimento para Habitação:
- Disponibilizar a cooperativas ou promotores privados em regime de Contrato de Desenvolvimento para Habitação (CDH) solos ou edifícios públicos para construção, reconversão ou reabilitação de imóveis para arrendamento acessível.
- Mobilizar solos públicos para projetos de arrendamento acessível:
- Cedência de terrenos na espera do Estado para promoção de arrendamento acessível por parte de privados e cooperativas.
Simplificar os processo de licenciamento:
- Licenciar com termo de responsabilidade dos projetistas:
- A aprovação dos projetos deverá ser feita com base nos termos de responsabilidade dos autores dos projetos.
- Juros de mora por incumprimento dos prazos de licenciamento:
- Criar um regime de juros de mora que visa aplicar uma sanção pecuniária aos municípios e às entidades externas envolvidas em caso de incumprimento dos prazos legalmente estabelecidos.
Reforçar a confianças dos senhorios:
- Criar um balcão único de arrendamento:
- A criação de um balcão de arrendamento que agregue Serviços de Injunção em Matéria de Arrendamento (SIMA) e Balcão Nacional do Arrendamento (BNA), com vista à simplificação dos procedimentos e à criação de um sistema integrado de acesso à informação.
- Estado arrenda diretamente aos senhorios por 5 anos e subarrenda assumindo o risco de incumprimento dos inquilinos;
- Estado garante pagamento após 3 meses de incumprimento (e depois, ou cobra, ou apoia, ou despeja):
- Estado assume o pagamento da renda após o terceiro mês de incumprimento, ficando sub-rogado na posição do senhorio para recuperação das quantias em dívida, mediante execução fiscal, ou promoção do despejo – salvo se se verificar existência de um motivo socialmente atendível que determine a atribuição de prestação social ou realojamento.
- Promover um modelo de pagamento da renda pelo Estado ao senhorio, depois de entrar no BNA. A Segurança Social garante a articulação com o arrendatário para, em situações de carência de meios, ser encontrada solução alternativa.
Aumentar a oferta pública:
- Estado Arrenda para Subarrendar:
- Objetivo:
- Disponibilização imediata de oferta de habitação para os agregados com especial dificuldade no acesso ao mercado de arrendamento.
- Explicação:
- O Estado vai arrendar imóveis a privados, nomeadamente devolutos, subarrendando com uma taxa de esforço máxima de 35% do agregado familiar.
- Isenção de mais-valias nas vendas de imóveis ao Estado e aos municípios:
- Regime atual:
- 50% da mais-valia sujeita às taxas progressivas de IRS.
- Regime proposto:
- Isenção de tributação, em sede de IRS, sobre as mais-valias resultantes de venda de imóveis ao Estado.
- Resultado:
- Redução da carga fiscal em 100%.
Arrendamento obrigatório de casas devolutas
- O Estado pode mobilizar património devoluto através do arrendamento obrigatório por
entidades públicas, com o respetivo pagamento de renda, para posterior
subarrendamento.
Promover arrendamento acessível:
- Manter-se-á a tributação de 0% em IRS a que acresce como novidade a tributação 0% em sede de IMI e também de isenção de IMT caso um imóvel seja comprado para o fim de habitação a renda acessível, com 6% de IVA para a reabilitação;
- Tributação de taxa 0% de IRS para quem migre, até ao final de 2024, uma casa da utilização de arrendamento local para arrendamento habitacional.
- Neste âmbito, propõe-se:
- Suspensão de novas licenças em todo o país;
- Atuais licenças sujeitas a reapreciação em 2030 e, a partir dessa data, licenças
sujeitas a renovação quinquenal não automática; - Caducidade das licenças por qualquer causa de transmissão;
- Conforme jurisprudência STJ, condomínios podem pôr termo às licenças
emitidas sem a sua aprovação; - Alargamento das competências de fiscalização às Juntas de Freguesia;
- Novo regime fiscal:
a. Transição de AL para arrendamento: Criação de nova isenção para
rendimentos prediais auferidos até 31/12/2030 em sede de IRS. Requisitos
de aplicação da isenção:
i. Transferência do imóvel afeto ao AL para mercado de arrendamento
habitacional.
ii. Estabelecimento de AL registado até 31/12/2022.
iii. Contrato de arrendamento celebrado até 31/12/2024.
b. Contribuição Extraordinária sobre o Alojamento Local: Criação de uma
contribuição extraordinária sobre o alojamento local (CEAL) a consignar ao
IHRU para financiar políticas de habitação acessível.
- Financiamento aos municípios para realizarem obras coercivas (Linha de financiamento num valor de 150M€).
- Incentivos fiscais ao arrendamento acessível
- Taxa de 6% de IVA em empreitadas para PAA (Programa de Arrendamento Acessível)
• Regime atual:
Empreitadas de reabilitação urbana localizadas em áreas de reabilitação urbana.
• Regime proposto:
Empreitadas de construção ou reabilitação de imóveis afetos a Programa de
Arrendamento Acessível. - Isenção de IMI para PAA
• Regime atual:
Isenção por 3 anos após reabilitação, prorrogável por mais 5 anos se afeto a
Habitação Própria e Permanente.
• Regime proposto:
Isenção por 3 anos após reabilitação se afeto a PAA. - Isenção de IMT para PAA
• Regime atual:
Isenção de IMT na compra para reabilitação.
• Regime proposto:
Isenção de IMT na compra para reabilitação se após a reabilitação for afeta a
PAA. - Linha de financiamento bonificado para privados
Linha de financiamento a taxas bonificadas para privados e cooperativas num
montante de 250M€.
- Taxa de 6% de IVA em empreitadas para PAA (Programa de Arrendamento Acessível)
Contratos de arrendamento pré-1990
- IMI e IRS a 0% com um apoio de compensação pela renda não cobrada pelas limitações de atualização ao longa das últimas décadas que está a ser definido.
Financiamento aos municípios:
- Apoio financeiro do Estado central para realizarem obras coercivas (de modo a dar eficácia à lei já em vigor);
Incentivo à transferência para habitação das casas em Alojamento Local
- Arrendamento obrigatório de casas devolutas (com o Estado a arrendar e a entregar a renda ao senhorio à força);
- Isenção fiscal ao arrendamento acessível.
Combater a especulação:
- Fim dos vistos gold:
- Neste âmbito, pretende-se salvaguardar que a renovação, a cada dois anos, dos vistos já atribuídos só ocorre se:
- i) o imóvel estiver alocado a residência própria e permanente do proprietário ou descendente;
- ii) se for objeto de contrato de arrendamento para habitação própria e permanente por prazo não inferior a 5 anos.
- Congelamento de novas licenças de alojamento local com exceção de alojamento rural nas regiões do interior;
- Reavaliação das licenças de Alojamento Local existentes em 2030 passando a ter validade de 5 anos a partir dessa data (as que vierem a ser atribuídas);
- Garantia de renda justa em novos contratos (com limites à atualização possível, face a contratos anteriores).
- Nos imóveis que já se encontravam no mercado de arrendamento nos últimos 10 anos, a renda inicial nos novos contratos não pode ultrapassar os 2% face à renda anterior. A este valor podem acrescer os coeficientes de atualização automática dos três anos anteriores – se os mesmos ainda não tiverem sido aplicados, considerando-se que em 2023 esse valor foi de 5,43%.
Proteger as famílias:
- Isenção de mais-valias para amortização de crédito à habitação do próprio e de descendentes:
- Isenção de IRS sobre as mais-valias resultantes da venda de outros imóveis do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, caso o valor de realização seja utilizado para amortização de crédito à habitação própria e permanente do próprio ou descendentes.
- No crédito à habitação:
- Obrigatoriedade de os bancos disponibilizarem uma alterativa de crédito à habitação a taxa fixa
- Apoio na subida da taxa de juro:
- Bonificação temporária do encargo com juros nos créditos hipotecários, para famílias
com rendimentos até ao 6º escalão de IRS e créditos até 200 mil €, através da compensação
de metade do excesso do indexante de referência face a 3% até um limite anual de 1,5
IAS (~720€). - No valor das rendas:
- Apoio extraordinário ao pagamento das rendas:
• Elegibilidade:
São elegíveis os agregados com taxas de esforço superiores a 35%, até ao sexto
escalão de rendimento, até aos limites de renda do Porta 65.
• Apoio:
O apoio corresponde à diferença entre a taxa de esforço real e a taxa de esforço
final de 35%, com um limite de prestação mensal de 200€ e para contratos
celebrados até 31.12.2022.
Exemplo 1:
Família monoparental, com um filho.
Rendimento:1400€
Renda: 900€ (T2 em Lisboa).
Recebe apoio de 200€.
Exemplo 2:
Casal com dois filhos
Rendimento: 2500€
Renda: 1200€ (T3 no Porto)
Recebe apoio de 200€ - Porta 65 +:
Apoio permanente, estendendo o apoio do Porta 65-Jovem a situações de maior
vulnerabilidade (designadamente, quebra de rendimentos superior a 20% ou famílias
monoparentais). O apoio funcionará em condições iguais às do Porta 65-Jovem.
Proteger os inquilinos com arrendamentos mais antigos Beneficiários:
- Senhorios cujos inquilinos sejam:
– Inquilinos de contratos de arrendamento celebrados antes do Regime do Arrendamento Urbano (antes de 1990) numa das seguintes situações:
– Inquilinos cujo rendimento anual bruto corrigido inferior a 5x a retribuição mínima nacional anual; OU
– Inquilinos cuja idade é superior a 65 anos ou deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60%. - Proposta:
- Isentar de IRS os rendimentos prediais e de IMI os senhorios com estes
contratos;
• Regime atual: Tributação de rendimentos prediais à taxa especial de 28% e
tributação de IMI em função da taxa fixada pelo município do imóvel.
• Regime proposto:
o IRS: Isenção total sobre rendimentos prediais obtidos por senhorios com:
(i) Contratos de arrendamento celebrados antes do RAU;
(ii) Rendimento anual bruto corrigido inferior a 5x a retribuição mínima nacional anual;
(iii) Idade superior a 65 anos ou com grau de deficiência superior a 60%.
o IMI: Isenção de IMI para os imóveis dos senhorios abrangidos. - Regulamentar a compensação a dar ao senhorio para compensar o não aumento
de rendas; - Garantir a não transição dos contratos para o NRAU.
Fim.
Nesta parafernália de ajudas a senhorios e a inquilinos, ainda não vi colocada nem respondida a seguinte questão:
– o senhorio diz ao inquilino que quer um aumento de 100€ na renda actual, senão, o contrato termina. E o inquilino como não quer ir para a rua paga, enquanto, o pagamento desse aumento não o impedir de comer.
Ou seja, tenho um contrato de arrendamento de um ano desde 2016 que se renova por igual período até que uma das partes o denuncie. O meu senhorio aumentou-me 20€ em 2019 e agora em 2023, aumentou 100€! E disse-me com uma grande lata: se não aceitar o aumento o contrato acaba aqui!
Ontem, assisti na TV a um primeiro-ministro “protector” dos pobres dos senhorios e da banca, com pagamentos para que essa classe não fuja com os seus prédios e com o capital, a fim de proporcionar um tectozinho aos desgraçadinhos dos indígenas / autóctones antes que sejamos engolidos pelo mar de gente com dinheiro que nos vem “colonizar”!
Depois admiram-se dos movimentos xenófobos em crescimento.
A Ana deixa de pagar e daqui a três meses o estado assume a responsabilidade.
Pois! Ainda que eu não acredite que isso vá funcionar, e ache injusto que seja o erário público, que pertence a todos nós, a servir para pagar aos especuladores imobiliários, mesmo assim, a “Ana” nunca se poria em situação dessas, pois preza muito a sua saúde mental.
O que a “Ana” e todas as “Anas” precisam é que se cumpra de uma vez por todas o direito constitucional a uma habitação condigna para todos!
Um contrato de 1977 a pagar 97,00€ como vai ser. Sabem explicar.