Certificados de Aforro Série F: valem a pena?

Os Certificados de Aforro Série F: valem a pena? Com a notícia do encerramento para novas subscrição da série E dos Certificados de Aforro, os arquivos do Economia e Finanças mereceram uma visita, nomeadamente recordando os artigos escritos em 2008, 2009 e 2010 durante um dos períodos de maior agonia dos Certificados de Aforro, provocada pela série C criada pelo secretário de estado Costa Manuel da Costa Pina.
De forma algo dramática, a 23 de janeiro de 2008, anunciávamos o fim dos Certificados de Aforro e, de facto, a agonia que se seguiu foi real e foram precisos muitos anos para que os portugueses voltassem a recuperar a confiança perdida no Estado enquanto devedor e provedor de soluções de poupança equilibradas para os residentes.

No dia 2 de junho de 2023 foi suspensa a série E e, a partir de 5 de junho de 2023 está disponível para subscrição a Série F dos Certificados de Aforro. Desta feita não se justifica ir tão longe no dramatismo até porque, furto de um banca muito zelosa de manter o pouco abonatório estatuto de ter das maiores margens entre taxas de juro ativas (o juro que cobra pelo dinheiro que empresta) e taxa de juro passivas (o juro que paga pelo dinheiro que recolhe como depósitos), comparativamente, a nova série de Certificados de Aforro continuará competitiva. Consulte aqui as melhores taxas de juro de depósitos a prazo para comparar.

Contudo…

Detalhes concretos sobre a Série F

Extraído da Portaria n.º 149-A/2023 de 2 de junho de 2023.

 

Valores de subscrição:

Valor nominal — € 1,00;

Mínimo de subscrição — 10 unidades;

Mínimo de certificados da «série F» por conta aforro — 100 unidades;

Máximo de certificados da «série F» por conta aforro — 50 000 unidades (na série E era de €250.000).

Este valor poderá ser alterado por despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças;

Máximo de certificados da «série F» acumulado com certificados da «série E» por conta aforro — 250 000 unidades. Este valor poderá ser alterado por despacho do membro do Governo responsável pela área das finanças.

Prazo e juros:

Prazo — 15 anos (mais cinco anos que na série E)

Taxa de juro — soma da taxa base na data de início do trimestre com o prémio de permanência atribuível à subscrição;
Taxa base — determinada mensalmente no antepenúltimo dia útil do mês, para vigorar durante o mês seguinte, segundo a fórmula:

E3 em que E3 é a média dos valores da Euribor a três meses observados nos 10 dias úteis anteriores, sendo o resultado arredondado à terceira casa decimal.

A taxa base não poderá ser superior a 2,50 % nem inferior a 0 %.

Período de contagem de juros:

Cada subscrição vencerá juros com uma periodicidade trimestral. O vencimento dos juros ocorre no dia do mês igual ao da data -valor da subscrição. No caso de esse dia não existir no mês de vencimento, o vencimento terá lugar no 1.º dia do mês seguinte.

Prémio de permanência em pontos percentuais (além da taxa base ter um limite 1 ponto percentual mais baixo que na série E, a série F também paga menores prémios nos primeiros 10 anos):

  • 0,25 do 2.º ao 5.º ano;
  • 0,50 do 6.º ao 9.º ano;
  • 1,00 no 10.º e 11.º;
  • 1,50 no 12.º e 13.º ano;
  • 1,75 no 14.º e 15.º ano.

Capitalização:

Capitalização automática dos juros vencidos (líquido de IRS).

Reembolso:

Reembolso de capital e juros capitalizados no 15.º aniversário da data -valor da subscrição. No caso de esse dia não existir no mês de vencimento, o crédito terá lugar no 1.º dia do mês seguinte.
Caso o reembolso ocorra em dia não útil, o respetivo crédito tem lugar no dia útil seguinte. O valor de reembolso é creditado no número internacional de conta bancária (IBAN) associado à conta aberta junto do IGCP, E. P. E.

Resgate antecipado:

Total ou parcial a partir da data em que ocorra o primeiro vencimento de juros da subscrição.
O resgate determina o reembolso do valor nominal das unidades resgatadas e do valor dos juros capitalizados até à data do resgate. O valor é creditado até ao 7.º dia após a instrução de resgate para o IBAN associado à conta aberta junto do IGCP.

Outra novidade é que os Certificados de Aforro passam a poder ser subscritos nos balcões de qualquer banco comercial.

Qual o racional para as mudanças dos Certificados de Aforro Série F?

É muito difícil, racionalmente, defender a opção seguida pelo governo de descer a remuneração dos certificados quando o cenário continua a ser de subida progressiva do juro que o Estado paga quando recorre a empréstimos nos mercados de capitais, essencialmente subscritos por estrangeiros.

Ainda que haja alguns aspetos defensáveis para justificar esta alteração, parecem-nos avassaladoramente suplantados pelos que recomendariam uma manutenção da situação inscrita na série E ou para uma mudança muito mais modesta das condições.

Algumas razões para perplexidade

A nova série passa de uma maturidade de 10 anos para 15 anos. Ora a 15 anos o Estado obtém taxas de juro no mercado a rondar os… 3,5% e ainda a subir. E 3,5% era a taxa base máxima a que o Estado se financiava na série anterior. A partir do 6º ano essa taxa atingia a majoração máxima de 1 ponto percentual o que levava a que, a partir desse momento, para quem já tivesse a série E há 6 anos, o juro bruto fosse de 4,5%. Maior do que no mercado, certo?

Bom, a verdade é que quando empresta a residentes e lhes paga juro, o Estado retem 28% desse juro como IRS. Ou seja, mesmo nesta situação que se aplicava aos últimos 4 anos da série E, o Estado só pagava 3,24%, o resto até aos 4,5% era devolvido ao Estado via IRS. E o Estado tem vários linhas de crédito ativas por amortizar ainda a juros bem superiores a 3,24%.

Por outro lado, quando o juro é pago a residentes, é razoável antecipar que a probabilidade desse rendimento se converter em investimento (maior potencial de crescimento económico) ou consumo (mais receita fiscal imediata) é muito mais elevada do que se esse rendimento for entregue, por exemplo, a um fundo de investimento multinacional que compra obrigações do tesouro português. Que, já agora, não paga IRS ao Estado Português.

Junte-se a este aspeto a vantagem que há em ter uma boa capacidade de captação interna de poupança por parte do Estado para reduzir a exposição às flutuações no mercado internacional e para afirmar globalmente que o nosso risco país é mitigado por esta disponibilidade interna em confiar no devedor Estado.

Recorde-se o Japão que tendo a maior dívida mundial é também dos países onde uma maior parte da dívida é financiado internamente. Aumentar a percentagem de dívida pública na mão de nacionais tem sido, aliás, um dos objetivos do IGCP. A situação mudou?

Não querendo ser exaustivo, há ainda a questão da promoção da poupança num dos países onde predominam os iliteratos financeiros.

Os certificados de aforro continuam a ser uma das poucas aplicações financeiras conhecidas largamente por grandes fatias de portugueses de vários estratos sociais e são um dos mecanismo de baixo risco para incentivar a poupança.

Ora é precisamente num período de grande popularidade que o governo decide alterar substancialmente o produto, alterando o prazo, as taxas de juro, os prémios, degradando a sua atratividade.

E, naturalmente, num Estado que todos os anos tem que, mesmo com eventual superavit, fazer a rotação de milhares de milhões de euros de dívida (tendo assim que ir ao mercado e sujeitar-se às taxas deste) e declara ele próprio, através do IGCP, a sua agência especializada, que o custo médio das novas emissões em 2023 já atinge os 3,5% (tendo subido de 1,7% em 2022), mais difícil se torna de entender esta micro-gestão dos Certificados de Aforro, ignorando aparentemente, tantas externalidade positivas que adviriam de uma manutenção da série anterior ou de uma nova série muito mais alinhada com anterior.

Fonte: IGCP. Clique para ampliar.

Os Certificados de Aforro deixaram de ser uma fonte prioritária de financiamento para o Governo?

O governo considera que o dinheiro dos aforradores será melhor aplicado como depósito a prazo na banca, como consumo, como amortizador de créditos, como investimento no imobiliário para continuar a sustentar os preços desse mercado?

Uma coisa é certa, com a redução das subscrições para um máximo de €50.000 e uma redução tão significativa do juro efetivo para os próximos tempos, o governo não está interessado em mais dinheiro dos residentes para se financiar.

 

13 comentários

  1. Bom dia.
    Salvo melhor opinião, a maturidade dos certificados de aforro é três meses e não de dez anos pois podem ser resgatados ao fim de noventa dias. Gostaria que o Economia e Finanças comentasse esta minha suposição pois, a confirmar-se, parte do que foi escrito está errado.
    Obrigado,

    1. Uma coisa é ser possível serem resgatados, outra é atingirem a maturidade obrigatoriamente ao fim de três meses. Há capitalização de juros e prémios de permanência incrementais com a fidelidade que conduzem o aforrador a manter o produto, em média, ao longo de muitos anos. Portanto, a comparação “correta” é algo volátil e depende do humor do aforrador, do ciclo económico e também da atratividade dos prémios de permanência e comparação geral do produto com o que há no mercado. O objetivo do Estado parece ser claramente o de que a poupança seja mantida até à maturidade máxima, dai os prémios muito expressivos, por exemplo, no 14º e 15º meses. Em função disto, e não sabendo publicamente qual é a maturidade média efetiva de cada série à data de hoje, considerámos como o mais correto, comparar com os produtos de maturidade próxima da maturidade máxima. No caso da nova série, a 15 anos, as taxas de juro das emissões em negociação têm oscilado entre os 3,4% e os 3,7% nas últimas semanas.

      1. Caro(a) Economia e Finanças,
        Obrigado.
        Se o credor pode dispor do dinheiro ao fim de três meses então a maturidade é de três meses, o que torna errada a comparação que fez com os 3,5% da YTM a dez anos em que o credor não poderá dispor do dinheiro antes do fim dos 10 anos, salvo se os vender em mercado secundário.

  2. Está a confundir resgate com maturidade. O resgaste poderá ser feito após os primeiros 3 meses a maturidade serao limite temporal da aplicação.

  3. Obrigado por ter confirmado que o resgate pode ser feito ao fim de três meses. Confirma-se assim que a comparação feita pelo Economia e Finanças com a dívida a dez anos e respectiva taxa de juro de 3,5% está errada: no caso da dívida a dez anos o credor (Estado) sabe que pode contar com o dinheiro durante dez anos enquanto que no caso dos certificados o mesmo Estado sabe que só pode contar com o dinheiro durante três meses, pois o subscritor pode levantá-lo ao fim desse prazo.

  4. Tem sido os governos socialista, desde o tempo de Sócrates que os certificados de aforro tem sido bastante afectados, quer na componente remuneratória, quer na sua confiança e incentivo. O estado deveria ser independente dos lobbys bancários, e ao contrário de promover divida publica interna, prefere a divida publica externa, com pagamento de juros elevados, saída de divisas e desmotivação na captação de poupanças. Afinal se recuarmos no tempo a hecatombe dos CA aconteceu em 2008.Fruto das politicas socialistas. 15 anos depois o mesmo desastre.!

  5. Nada do que escreveu interessa para avaliar o que estava em discussão – a validade técnica deste artigo do Economia e Finanças – que desse ponto de vista (técnico) está errado nesta comparação com a taxa de juro da dívida a dez anos.

    1. Do ponto de vista do devedor o que interessa é o risco potencial de resgate (cenário altamente improvável) e não a maturidade real que enfrenta num produto que pode estender-se por 15 anos? Devemos portanto comparar certificados de aforro a 15 anos com juros capitalizáveis e prémios de permanência crescentes, com bilhetes de tesouro a 3 meses? É essa a análise correta no seu ponto de vista? Não sei o que é “uma comparação tecnicamente correta”, mas economicamente seria um perfeito disparate, certamente. O IGCP saberá melhor que ninguém qual é o cenário médio, o tempo médio até ao resgate. Se esse dado fosse público seria esse que faria sentido usar. Não sendo conhecido, optámos pela que nos parece mais alinhada com o interesse do emissor.

  6. A comparação deve ser feita entre a taxa de rentabilidade dos certificados de aforro com maturidade de três meses com a mesma taxa ao mesmo prazo em mercado secundário acrescida de um prémio pelo facto de o dinheiro ser emprestado dentro de portas o que fomenta a poupança e mitiga a inflação. Tudo o resto são comparações tecnicamente incorrectas.

  7. Gostava que me explicassem qual a razão para que “só podem ser titulares pessoas singulares e não é possível a indicação de movimentador”. Entendo que as sociedades comerciais, anónimas ou de responsabilidade limitada, não possam ser titulares, mas considero uma aberração o facto de um casal, por exemplo, casado em comunhão de bens, não possam ser ambos titulares da mesma conta. O que estará por detrás desta imposição?
    Grato!

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