A Regulação Financeira e a CGD: mudar do regulador para o regulado como quem bebe um copo de água

Nuno Garoupa investigador português no Estados Unidos foi, no seu artigo “Caixa Geral de Depósitos“, até ao momento, a única pessoa que identificámos como tendo sublinhado publicamente um problema grave que tem o potencial para enfraquecer de forma preocupante o poder efectivo dos reguladores e que se tem repetido com frequência: as instituições financeiras recrutarem, até ao mais alto nível, quadros dos reguladores e supervisores (neste caso financeiros).

Para memória futura o pequeno artigo de Nuno Garoupa no The Portuguese Daily:

” Quite surprisingly, the appointment of a new administration for the state-owned banking corporation CGD has emerged as priority. CGD operates in a highly regulated industry. The Bank of Portugal is the regulator. CGD is the largest bank in Portugal. The government selects the one who regulates to manage the one who is regulated. Economists call this the revolving door problem in regulation. Hundreds of papers in the economics of regulation and public choice address the perverse effects of the revolving door behavior in politics. Nobody in Portugal, but literally nobody seems to be worried about it. Remarkable! More remarkable when there have been accusations of regulatory failure against the Bank of Portugal (due to BPN and BPP scandals a couple of years ago).”

O que é inegável é que o mercado natural dos quadros técnicos de um regulador (especializados num determinado mercado) são os agentes desse mesmo mercado, tipicamente instituições que eles estarão a regular. Até que ponto o facto de se saber que a carreira profissional de uma pessoa poderá passar por aquele que tem de fiscalizar e escrutinar, condiciona o desempenho profissional e a eficácia no cumprimento da missão?

Do mesmo modo, até que ponto as condições de trabalho oferecidas pelo regulador são competitivas com o mercado? Até que ponto os níveis de atrito (entradas e saídas de recursos humanos) são alvo de análise? A questão não apresenta soluções fáceis e lineares, soluções que tipicamente conduziriam a outros problemas igualmente preocupantes, mas merece, pode e deve ser abordada e mitigada, no mínimo, continuamente escrutinada.

Extrapole-se agora esta questão para os quadros de topo, de administração dos reguladores, onde passar dos regulados para o regulador/legislador e regressar aos primeiros parece ser tão natural quanto beber um copo de água. Poderão os reguladores ser na prática pouco mais do que embaixadas dos regulados, perfeitamente capturados pelos interesses de quem deviam regular? Poderá parte da passividade dos reguladores face às falhas de mercado mais ou menos evidentes e às práticas inadequadas dos regulados ser explicada  por este fenómeno de revolving door (porta giratória) de que fala Nuno Garoupa?

“(…) Political analysts claim that an unhealthy relationship can develop between the private sector and government, based on the granting of reciprocated privileges to the detriment of the nation and can lead to regulatory capture. (…)” in Wikipedia

Mais do que lançar acusações ou deixar aqui processos de intenção ou suspeições, julgamos ser importante amplificar a inquietação  relatada pelo investigador Nuno Garoupa. Uma inquietação tanto mais justificada quanto mais ignorado e esquecido parece ser este efectivo risco económico, regulatório e, quem sabe, sistémico.

Deixar uma resposta