O preço e a renda das casas vão descer com estas novas medidas na habitação?

Conhecidos que são alguns detalhes de um novo pacote – essencialmente fiscal – dedicado ao tema da habitação há uma pergunta cuja resposta determinará, em boa medida, a avaliação da eficácia destas políticas: o preço e a renda das casas vão descer com estas novas medidas na habitação?

Recordemos os dois artigos que dão destaque às medidas que nos parecem mais significativas:

Casas novas com IVA reduzido de 23% para 6%

Senhorios: casas arrendadas até €2300/mês taxadas a 10% em IRS

Medidas muito diferentes das isenções e apoio aos compradores

Se aquando da aprovação da isenção do IMT jovem e do apoio ao crédito e IMI reduzido, a conclusão nos parecia óbvia e negativa – ou seja, as medidas ao centrarem-se do lado de quem compra (da procura) estavam condenadas a estimular ainda mais o mercado no sentido da subida de preços (como as estatísticas do último ano parecem comprovar), face às medidas agora anunciadas, a expectativa será diferente.

Uma leitura superficial poderá criticar as medidas pelo seu impacto direto mais óbvio: estamos a descer impostos e essa descida abrange situações que dificilmente parecem estar enquadradas com cuidados com a classe média (os limiares dos preços de venda ou das rendas estão bem acima dos que a grande maioria da população está em condições de pagar). E se é certo que se poderá discutir e descer esses limiares sem que haja necessariamente uma alteração fundamental da eficácia destas medidas, também é verdade que as fasquias colocadas não são necessariamente excessivas perante o objetivo.

E qual é o objetivo?

  •  Tornar o acesso a habitação própria e permanente mais fácil para os residentes.

Para quem constroi…

Ora se a oferta, se o contingente de casa disponíveis no mercado não mexe e se a procura continua acima dessa oferta, qualquer euro a mais que possa ser desviado para ter um teto sobre a cabeça sê-lo-á e os preços continuarão a subir. Sejam na compra seja no arrendamento. Assim sendo, é fundamental desbloquear o oferta, garantir que mais casas habitáveis chegam ao mercado.

Estas medidas de forte descida de impostos sobre o rendimento predial e sobre os custos de construção poderão, de facto, ser um estimulo na oferta com foco em vários horizontes temporais.

Sem margem para dúvidas, construir ou reabilitar para vender casas até aos €648.000 passa a ser um negócio bem mais rentável. Tal como construir ou reabilitar para arrendar com renda até aos €2.300.

Com isto não quer dizer que essa atividade não era já economicamente lucrativa, no entanto, ao passar a sê-lo mais rentável poderá ultrapassar  outras atividades de construção ou até de outros sectores económicos com as quais estava a competir por recursos. A verdade é que nos últimos anos além de haver um estrangulamento por falta de pessoal e empresas dedicadas à construção, as que há têm desviado os seus investimentos para atividades mais rentáveis, como a construção de hotéis, de estabelecimentos comerciais ou de habitação premium ou de luxo.

  • Será que com IVA a 6% para casas até aos €648.000 essas outras atividades continuarão a capturar os recursos ou teremos mais empresas e investidores a olhar para a construção de imóveis habitacionais até aos €648.000 com maior interesse?

A resposta a esta pergunta será importante para definir o sucesso desta política, pelo menos do lado da construção.

Para os senhorios atuais e potenciais novos senhorios

A oferta de casas não se resume à construção de casas novas.

A medida que torna o arrendamento per se muito mais rentável (com o IRS a poder descer de 25% para 10% ou até para 0%) sem exigências de prazo de arrendamento, “apenas” impondo rendas que não podem superar os €2.300, poderá tornar muito mais interessante  colocar casas que estão devolutas no mercado.

Quantas dezenas ou centenas de milhar de habitações estão paradas? Quantas estão habitáveis? E quantas poderão reentrar no mercado no curto e médio prazo com estas medidas?

Sendo impossível antecipar o volume a verdade é que os incentivos para colocar no mercado são agora muito maiores. Passar em poucos anos de uma taxa liberatória de IRS de 28% para 10% ou até 0% (se o renda não ultrapassar os 80% da renda mediana local) é colocar no bolso dos senhorios muito dinheiro. E é tornar este investimento e os rendimentos dele provenientes fiscalmente muito mais “baratos” do que, por exemplo, um investimento em depósitos a prazo, certificados de aforro ou valores mobiliários.

No entanto este é dinheiro que só existe para ganhar se se colocarem as casas a arrendar no mercado. Em linguagem económica, o custo de oportunidade de ter a casa parada dispara com este novo enquadramento fiscal.

Em suma, as perguntas chave que nos darão a resposta passarão também por:

  • Quantos estarão dispostos a ultrapassar os motivos que os levavam a preferir ser as casas parqueadas a coloca-las no mercado com estas alterações?
  • Quanto acreditarão que haverá estabilidade política suficiente para que estas medidas não sejam rapidamente revertidas, justificando apostas de médio e longo prazo?

Em conclusão…

Poderá haver outras medidas complementares como o seguro de arrendamento, a construção de serviços de arrendamento com capacidade de responsabilizar inquilinos e senhorios pelas respetivas obrigações contratuais (como existe noutros países), uma maior celeridade nos casos de litígio judicial, etc, mas parece-nos inegável que a dimensão do choque fiscal é suficiente para antecipar que estas medidas têm o potencial para agitar o mercado no sentido de trazer mais oferta no curto e médio prazo (devolutos e recuperações ligeiras) mas também no longo prazo (promovendo novos investimentos e novas entradas no setor).

Será também muito importante perceber:

  • Como se equilibrará o orçamento do estado com esta nova descida significativa de receita que até ao momento não surgiu quantificada;
  • Será interessante perceber se perante uma descida tão expressiva dos impostos haverá uma campanha de tolerância zero sobre quem, ainda assim, insistir em fazer contratos ilegais para continuar a fugir aos impostos e às responsabilidades.
  • Nesse sentido, com um aumento das rendas dedutíveis pelos inquilinos (passando de €700 para €800 e depois para €900 nos próximos anos) em sede de IRS há ainda outro incentivo à legalização.
  • Qual será o impacto nas alternativas de poupança e investimento que irão sofrer concorrência;

Mas aguardemos pelos detalhes e por perceber qual será a versão final que resultará do parlamento. O poder político e este governo em particular, já por diversas vezes anunciou medidas e pacotes que numa segunda e terceira leitura se revelaram bastante diferentes do que pareciam no início. Talvez não seja o caso. Veremos.

8 comentários

  1. Na minha opinião as rendas não vão baixar até pelo contrário vão continuar a ficar cada vez mais altas esta medida só vai beneficiar para os senhorios terem ainda mais rendimentos sobre o valor altíssimo das rendas

  2. Deixa umas questões em aberto o Iva da construção baixar. Apartamentos ainda em construção que termina para o ano irão beneficiar? E contratos já feitos, os preços serão ajustados? O preço foi decidido com base no iva atual de 23%, como vão resolver esses cenários?

  3. E os imóveis sub-aproveitados com rendas congeladas em que, muitas vezes, ninguem habita mas que são mantidos pelos inquilinos (muitas vezes com elevados rendimentos) devido às rendas ridiculamente baixas? Estes senhorios, expoliados do seu património, são obviamente portugueses de segunda categoria e por isso não contam.

  4. Com esta medida não há abaixamento de rendas. isto é uma ilusão e não estamos no circo.
    As rendas só ´baixam se houver congelamento. um teto para o seu aumento. caso contrário é tudo uma palhaçada.

  5. As rendas não vão baixar com esta medida do governo, só vão aumentar, o que será das pessoas que precisam arrendar casa. O aumento da dedução à coleta é outra anedota. A classe média está em extinção.

  6. mais um passo, para os despejos e aumento das rendas. com uma taxa de IRS de 10%, e com a ganância dos senhorios em alta, as rendas não vão baixar, vão subir. Só um leigo, idiota como o primeiro-ministro, pode pensar o contrário, e com o PR a ajudar. os portugueses não têm salário para isto. vai ser vem pior do que o que está. ninguém se preocup com os inquilinos, só com os senhorios e os investidores. estamos a saque.

  7. A propósito da temática da habitação, e dado o momento da discussão, apresentação de propostas e sugestões para a aprovação do orçamento de estado para o próximo ano de 2026, julgo que seria oportuno mostrar e evidenciar que muitos portugueses passaram a ter dificuldades acrescidas na compra de uma casa de habitação para os seus filhos quando este atual governo acabou no final de 2024 com a medida que tinha sido implementada pelo governo de António Costa, que consistia na possibilidade de algumas pessoas poderem ajudar os seus filhos nos seus empréstimos bancários com a venda de algum do seu património urbano.
    Considera-se, por isso, que seria muito importante que essa medida pudesse ser reposta neste orçamento de estado, porque daria um excelente contributo para melhorar a situação da habitação em Portugal, incentivando muitas pessoas a colocar no mercado algum do seu património predial, ao terem um medida fiscal que permitia a possibilidade de isenção de terem de pagar mais valias se viessem a desfazer-se de algum desse património que possuem (uma segunda casa que tenham, e que não necessitem dela, por exemplo)…

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *