Porque é que a semana que passou provou o fracasso total da troika e a nossa morte lenta?

Colocando um sapo num tacho com água tépida ao lume e aumentando de forma lenta e progressiva o lume, o batráquio acaba por nunca saltar do tacho acabando por morrer cozido apesar de não ter sequer um testo a impedir-lhe o salto. Portugal é hoje um sapo nessa situação? Vejamos.

No momento em que se iniciou a crise política em Portugal durante a passada semana, os “mercados” recordaram-se depressa do guião grego e admitiram que podia estar em risco o apoio da troika a Portugal. E, nesse instante, viram-se forçados a olhar para os fundamentais da economia portuguesa para avaliarem o que fazer. E que concluíram? Que não estamos de todo mais perto da sustentabildiade económica do que em maio de 2011, muito pelo contrário.

Os juros da dívida pública em mercado secundário dispararam, a existência do sector financeiro nacional foi imediatamente posta em causa na bolsa de valores e todas as declarações internacionais de que a crise da zona euro já tinha acabado foram alvo de chacota e de negação empírica nos mercados, bem como em artigos e editoriais da imprensa internacional especializada.

O soluço português da passada semana recordou aos distraídos que é hoje internacionalmente aceite, exceto entre os nossos parceiros da Comissão Europeia e do Banco Central Europeu que a austeridade há muito foi engavetada como caminho de recuperação para a periferia da Europa e/ou como modelo de sustentabilidade da própria União Europeia ou Zona Euro. O que importa é se há quem fie quando precisarmos de dinheiro, nem que seja o BCE de uma forma algo coxa e mal amanhada, pelo menos para já.

Os mercados seguem cada vez mais a perspetiva de curto prazo, saber se pagaremos a dívida que temos a longo prazo, é irrelevante. O problema é que o fiador é muito volúvel e faz depender da continuação do programa de austeridade o seu compromisso. E porque é que isto é um problema? Porque a “solução” da austeridade produzirá a eternização do crescimento económico anémico ou negativa, a permanência de uma taxa de desemprego altíssima e a eternização de uma situação de total dependência dos caprichos externos em termos de proteção futura. Tudo tem piorado e, no essencial, ninguém acredita que melhorará. Seremos um país condenado a experimentar o que experimenta o sapo no tacho, negociando, na melhor das hipóteses, a velocidade a que se aumenta a temperatura do tacho e nunca uma forma de se desligar o lume e de nos levarem para a enfermaria.

O que fazer?

Perante esta evidência do caos em que mergulharemos se deixarmos de contar com a fiador resta-nos alguma alternativa?

Respondo questionando o sapo. Saltar do tacho implicará sem sombra de dúvida uma queimadela grave pois aterrará no meio do lume, chamuscada a pata, contudo, terá ainda alavanca na perna para saltar do fogão para porto seguro evitando a morte certa.

Creio que connosco  a alternativa será desta natureza. Enfrentar com coragem e inteligência a situação atual e o que se projeta para a futuro, preparando a população para uma alternativa que exigirá um sacrifício que num primeiro momento ninguém pode negar que pode ser brutal mas limitado no tempo (a tal patinha queimada) e garante de que teremos a oportunidade de evitar a morte certa que hoje insistimos em negar e que este episódio recente nos devia ajudar a reconhecer sem mais demoras.

O que fará a nossa elite?

Terá coragem para assumir o risco do choque de uma saída do euro, preparando o melhor possível como os amigos que tivermos e com os ensinamento da experiência alheia o dia seguinte? Ou preferirá continuar a negociar a temperatura do tacho com um cozinheiro louco, apegando-se a instrumentos (o Euro e os atuais tratados europeus) que há muito deixaram de servir os ideais políticos que professam? Continuarão aqueles que já perceberam o sarilho em que estamos metidos a acreditar numa volta de 180º a ocorrer na política europeia de modo que se criem condições salubres para a nossa permanência no euro? E se sim, até quando?

A questão que nos interessa parece-me cada vez mais o como e o quando do que o se.  Mas os desígnios da política, os incentivos peculiares oferecidos a quem a ela se dedica, e a falta de coragem para tomar decisões dramáticas e de risco, não nos garantem que evitemos o destino do sapo. Muito terá de ser feito para pressionar que se revele a verdade e que esta se enquadre na discussão política interna e internacional por aqueles que, tal como muitos lá fora (desde logo, nos mercados), já perceberam: o enorme logro e mentira em que estamos envolvidos. Trabalho a ser feito por nós.

Rui Cerdeira Branco

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