Más notícias: inflação média anual dispara de 6,0% para 6,7% em apenas um mês. Que perspetivas para o futuro?

A inflação média anual dispara de 6,0% para 6,7% em apenas um mês. Estas são más notícias sob qualquer ângulo de análise. De facto, depois de, entre junho e setembro de 2022, a variação homóloga ter dado a ilusão de que poderíamos estar próximo de um planalto (8,7% em junho, 9,1% em julho, 8,9% em agosto e 9,3% em setembro) a inflação homóloga dispara em outubro para 10,2% naquele que é o maior aumento num único mês desde abril de 2022.

A inflação está assim a acelerar de novo e nem mesmo a inflação média anual, que, no seu cálculo, considera os últimos 24 meses de inflação, resiste a revelar uma forte subida. Essa média mais alisada em setembro apontava para uma inflação média anual de 6,0%, mas em outubro salta para 6,7%. É este o aumento do custo de vida no ano terminado em outubro medido através de um cabaz de preços associados à despesa habitual do consumidor médio em Portugal (índice de preços no consumidor).

Outubro de 2022: novo mês de recordes na inflação

Com os dados da primeira estimativa do INE para a evolução do índice de preços no consumidor em outubro de 2022, sucedem-se os recordes negativos a assinalar.

Desde logo, o facto de a variação homóloga de 10,2% – a que compara o custo do cabaz de preços no consumidor entre o mesmo mês de anos sucessivos, ou seja, neste caso, entre quanto custavam os bens e serviços em outubro de 2021 face a outubro de 2022 – ser a maior em 30 anos, desde maio de 1992.

Outro recorde especialmente preocupante é o que se prende com a inflação subjacente. A este propósito citamos diretamente o INE:

O indicador de inflação subjacente (índice total excluindo produtos alimentares não transformados e energéticos) terá registado uma variação de 7,1% (6,9% no mês anterior), taxa mais elevada desde janeiro de 1994. Estima-se que a taxa de variação homóloga do índice relativo aos produtos energéticos terá aumentado para 27,6% (taxa superior em 5,4 p.p. face ao mês precedente, destacando-se os aumentos de preços do gás natural), enquanto o índice referente aos produtos alimentares não transformados terá apresentado uma variação de 18,9% (16,9% em setembro), taxa mais elevada desde junho de 1990. 

Tal como em meses anteriores, a evolução do preço dos combustíveis e produtos energéticos continua a ser o principal motor da inflação, mas a duração deste comportamento tem progressivamente o efeito de mancha de óleo fazendo a inflação alastrar para todas as áreas que sofrem impacto pelos aumentos dos custos de produção, bem como outras áreas que face à mudança das expectativas de evolução dos preços começam a ir “à boleia”.
As grandes questões para os próximos meses prendem-se com o jogo de forças entre comportamentos com impactos opostos na evolução dos preços.

Os Bancos Centrais estão a usar o medicamento certo para doença?

A inflação que é historicamente contida com a intervenção dos bancos centrais, resulta de uma economia começar a crescer a um ritmo muito superior àquele a que o setor produtor consegue responder. Os preços crescem por haver uma aceleração da procura para uma oferta que demora mais tempo a reagir (é preciso montar novas fábricas, novos escritórios, etc).
Perante este fervor consumista e de modo a “dar tempo” ao lado da oferta para este apanhar o ritmo da procura, os bancos centrais encarecem o preço do dinheiro, instalam a incerteza naquele que era um cenário de otimismo excessivo e conseguem com alguma celeridade conter o consumismo, idealmente alinhando ritmo entre procura e oferta sem gerar grande dor. É pelo menos isto que vem nos manuais, em português para leigos. Mas era e é esta a situação atual? É este tipo de mecanismo que está montado e a gerar a inflação atual?
É defensável dizer que a economia nos EUA estava a sobreaquecer há largos meses e o Banco Central Norte Americano começou a reagir “secando” a economia de dinheiro barato. Fê-lo e continua a fazê-lo, nomeadamente, aumentando o preço do dinheiro.

No entanto, noutros espaços económicos do globo onde também havia dinheiro barato, a economia estava longe de se encontrar em sobreaquecimento. As cadeias de logística disrupção estavam ainda a sofrer com a COVID e surgiu uma guerra que fez disparar custos de produção de forma inusitada à conta do problema energético associado.

A inflação já subia antes da guerra muito à conta de um desfasamento entre procura e oferta que resultava muito mais da “destruição” gerada na oferta pelo covid do que por existir uma qualquer aceleração continuada e duradoura do consumo.

A verdade é que os Bancos centrais têm um mandato e só t~em um tipo de remédios, antibióticos. Sucede que, pelo menos na Europa, a doença é de natureza viral, e os antibióticos limitar-se-ão a agir sobre infeções parasitárias que possam surgir de forma oportunista, nada farão para matar o vírus.

A verdade é que o poder de compra já está em queda há largos meses e, com isso, a capacidade de consumir degrada-se reduzindo por essa via a pressão sobre os preços. Ainda assim, como a subida dos preços, tem tido muito pouco a ver com um aumento da pressão do consumo sobre a produção, mas antes um aumento externo dos custos de produção, a prática habitual de esmagar o consumo para fazer com que os produtores aceitem descer os preços não funciona, ou, pelo menos, demora a ter efeitos.

Contudo, é nisto que continuam a apostar os bancos centrais: reduzir os recursos disponíveis das famílias de modo que a procura colapse para assim conter os preços.

Será uma questão de tempo e de intensidade de recessão/depressão até que os Bancos Centrais tenham sucesso? Provavelmente, mas tudo indica que este é o pior caminho possível, podendo ser necessária uma recessão de grande dimensão, geradora de enorme sofrimento e com imprevisíveis consequências políticas, bem maior do que a que seria necessária caso as razões para a existência de inflação resultassem, em primeira ordem, de um efetivo crescimento muito acelerado da economia.

Um futuro de imensas incertezas

Como irão os orçamentos nacionais e respetivos governos lidar com a miséria induzida por uma recessão vista como indispensável pelos banqueiros centrais?

Que normalidade terá que ser suspensa para que novas políticas públicas sejam lançadas para evitar consequências políticas e sociais dramáticas?

E como evoluirão os fatores que fazem os preços da energia bater recordes (crise climática e crise militar)?

E até onde a integração económica entre blocos (EUA e Europa) irá forçar uns e outros a não poderem ter políticas monetárias muito diferentes, apesar de as respetivas “doenças” não serem as mesmas?

E que consequências de médio prazo terá este período na relação entre estados e economias mundiais e dentro da própria União Europeia?

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