A 31 de julho de 2017, através do Decreto Regulamentar n.º 6/2017 o ministério da saúde definiu o regulamento para o acesso à gestação de substituição colmatando uma lacuna legal que vinha ganho relevância à medida que esta prática vem sendo implementada em Portugal. Note-se que o acesso à gestão de substituição se encontrava já definido pela Lei n.º 25/2016, de 22 de agosto, conferindo a esta prática um caráter excecional e com condicionalismos a cumprir muito rigorosos e limitativos.
Em termos práticos, recorda-se que a gestão de substituição, em Portugal, exigirá sempre que se esteja presenta a uma situação de “ausência de útero e de lesão ou doença deste órgão que impeça de forma absoluta e definitiva a gravidez da mulher ou em situações clínicas que o justifiquem” estando esta prática sempre vinculada “à celebração de contratos de gestação de substituição, que depende de autorização do Conselho Nacional de Procriação Medicamente Assistida (CNPMA) e audição prévia da Ordem dos Médicos”, como se pode ler no preâmbulo do decreto regulamentar.
Entre as principais preocupações do legislador no decreto regulamentar que aqui se apresenta, esteve a tradução prática, em norma, do que já estava genericamente previsto na lei, nomeadamente, ao nível da regulação da relação entre a mãe genética e a criança que se projeta no sentido de minimizar impactos psicológicos em ambos, bem como, ao nível dos limites e enquadramento dos contratos a realizar entre as partes que se mantém obrigatoriamente gratuito. O legislador sublinha ainda que esta regulamentação teve o cuidado de não criar “constrangimentos adicionais que não constem de lei expressa, sob pena de violação da reserva de lei”.
Do preâmbulo da norma que regula a gestão de substituição destacamos os seguintes parágrafos quatro parágrafos que abordam os objetivos fundamentais do decreto regulamentar (sublinhados nossos):
“(…) Neste sentido, importa através do presente decreto regulamentar definir o procedimento de autorização prévia a que se encontra sujeita a celebração de negócios jurídicos de gestação de substituição, assim como o próprio contrato de gestação de substituição, cuja supervisão compete ao CNPMA, devendo garantir-se que os contratos de gestação de substituição asseguram a prevalência dos interesses da criança sobre quaisquer outros e que os interesses da mulher gestante são tidos em devida consideração.
Destaca-se a importância de privilegiar a ligação da mãe genética com a criança, ao longo do processo de gestação de substituição, designadamente no âmbito da celebração e da execução do próprio contrato, circunscrevendo-se a relação da gestante de substituição com a criança nascida ao mínimo indispensável, pelos potenciais riscos psicológicos e afetivos que essa relação comporta. Isto, obviamente, sem prejuízo das situações em que a gestante de substituição é uma familiar próxima, em que poderá existir, habitualmente, uma relação entre a gestante de substituição e a criança nascida. Procura-se, ainda, assegurar a máxima segurança médica possível, acautelando o envolvimento de todas as partes, numa decisão alicerçada na tutela de interesses comuns e, em especial, dos interesses da criança.
Seguindo o princípio de equilíbrio e prevenção de possíveis complicações físicas e psicológicas para a gestante de substituição, deve ser garantida à mesma, no âmbito do próprio contrato, um acompanhamento psicológico antes e após o parto.
Por fim, dada a necessidade de PMA [Procriação Medicamente Assistida] no âmbito das situações de gestação de substituição, é premente assegurar o princípio da igualdade de tratamento no recurso às técnicas de PMA, em especial, no contexto do Serviço Nacional de Saúde, entre os beneficiários desta alternativa terapêutica e os beneficiários que reúnam os requisitos previstos nos artigos 4.º e 6.º da Lei n.º 32/2006, de 26 de julho, alterada pelas Leis n.os 59/2007, de 4 de setembro, 17/2016, de 20 de junho, e 25/2016, de 22 de agosto, assim como a correta qualificação da gestante de substituição e do casal beneficiário para efeitos de aplicação do regime de proteção de parentalidade. (…)”