Banca Nacional: a vender pentes a carecas?

Eis um excerto de um editorial recente de João Cândido Silva que cita o plano de actividades da CMVM para 2011 e 2012,  abordando os produtos financeiros complexos já aqui anteriormente visados. Vale a pena reter os exemplos antes de ir ao banco, pois por mais confiança que tenha e por mais financeiramente literato que seja, pode sempre ter o azar de enfrentar uma “força de vendas” com incentivos muito fortes:

” (…)Se dúvidas houvesse de que os produtos financeiros complexos, ou “estruturados”, são alçapões onde os investidores inexperientes podem ver desaparecer o seu dinheiro, os casos reais relatados pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários nos documentos em que detalha o plano de actividades para 2011 e 2012 são elucidativos. E chocantes, também. Merecem ser lidos e relidos, como exemplos de que os bancos são capazes de expor os clientes a riscos não solicitados, nem devidamente explicados e apreendidos, provando que estão muito longe de serem consultores fiáveis para ajudarem a aplicar o dinheiro de quem procura os seus serviços.

 Entre as situações que foram objecto de reclamação junto do regulador, há a de um cliente “sem qualquer escolaridade e sem antecedentes de investimento em instrumentos financeiros de risco” que, depois de ter pedido a constituição de um depósito a prazo, “acabou por subscrever, por sugestão de um funcionário da agência bancária, um fundo especial de investimento” cuja desvalorização amputou uma parte do capital aplicado.

Noutro caso, foi sugerida a subscrição de obrigações com uma maturidade de 30 anos a um cliente quase septuagenário, sem que este fosse alertado para o risco envolvido e para o prazo da emissão.

E ainda há o caso de um pedido de constituição de uma conta a prazo que, veio a descobrir-se, o banco decidiu transformar na subscrição de um empréstimo obrigacionista de uma empresa, com um prazo de três décadas, quando um dos titulares da aplicação tinha, na altura, a idade de 87 anos. (…)”

Esta questão, além de dever, naturalmente preocupar a CMVM, parece revelar um problema bem mais complexo e que talvez ultrapasse a esfera de actuação deste regulador. Na prática, estamos perante um mercado onde é extremamente difícil a um investidor não qualificado (habitualmente o cidadão comum) obter informação credível, desinteressada e de qualidade sobre o que fazer ao seu capital. Notoriamente, por maiores que sejam as melhorias futuras, não é de esperar que um gestor de conta de um banco que possui um grupo multifacetado e com multiplos interesses (bancos que geralmente detêm o controlo das sociedades gestoras de fundos, por exemplo) venha algum dia a ser um consultor financeiro imparcial. Ou surge de forma mais disseminada a figura do assessor financeiro, pago directamente pelo investidor e não pelas comissões dos produtos que consegue vender ao investidor, ou se terá de caminhar para uma intervenção ao nível da concorrência que separe efectivamente o retalho bancário, dos produtos que se vendem a retalho – um banco não pode vender produtos de sua marca branca sem que com isso entre em conflito de interesses face aos interesses do cliente.

Entretanto, convém que se aposte tudo na literacia financeira para que o pequeno investidor ao menos saiba o que move quem tem à sua frente a tentar vender-lhe, por exemplo, produtos financeiros complexos.

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