Quem tem medo de arrendar casa?

Segundo o Público, citando um estudo da Confederação da Construção e do Imobiliário, há hoje mais de um milhão de casas alugadas ou disponíveis para aluguer em Portugal, cerca de 20% das habitações do país.

A dificuldade crescente em adquirir casa por parte dos portugueses parece ser a principal razão para o forte crescimento deste segmento do mercado imobiliário. Com obstáculos adicionais e crescente à concessão de crédito a muitas famílias, torna-se difícil encontrar alojamento para quem procura e difícil de vender para quem quer vender o um imóvel.

 Sendo certo que arrendar casa continua a ser um negócio de alto risco para ambas as partes, a necessidade parece estar a levar a que muitos considerem que o risco de caírem num conto do vigário é hoje suportável face ao prejuízo de não conseguir extrair rendimento algum de um imóvel que viu os seus encargos aumentarem na generalidade dos casos por via fiscal nos últimos anos.

O apego à posse do lar, por outro lado, terá também passado para segundo plano para muitos, seja a virtude da necessidade (ausência prática dessa opção), seja por se estar a valorizar hoje mais a mobilidade do que no passado.Lida a notícia e as propostas de explicação, retenho no entanto a permanência de fortes factores de risco que seguramente estarão ainda a impedir que este mercado, tido por muitos como vital para qualquer economia saudável, continue sub-dimensionado e pouco concorrencial face ao que sucede em outros países.  O que falta?

Falta a quem se decide a pagar a renda, ter a garantia rápida e consequente de que o senhorio cumpre o seu lado do contrato, repondo a imóvel e o recheio nos termos em que o arrendou sempre que surjam imprevistos não imputáveis a quem está a usufruir.

Mas falta também, talvez de modo mais claro, protecção do lado do proprietário que acaba por ser a parte mais vulnerável a abusos, danos e longas esperas pela justiça caso tenha o azar de contratar o arrendamento com profissionais do despejo moroso ou, até, simplesmente, com inquilinos em apuros financeiros – um problema social mas que dificilmente se compreende ficar a cargo do senhoria sem qualquer salvaguarda eficaz. 

Embutir um esquema de avaliação judicial de foro arbitral no próprio contrato (com participação obrigatória no momento de celebração e de extinção do contrato), criando uma entidade que intermediaria e decidiria com toda a celeridade os inevitáveis diferendos que fossem surgindo seria uma garantia poderosa para agilizar o mercado.Constituir uma lista negra de clientes relapsos à semelhança do que já sucede em outros mercados também não seria desprezível. E, claro, tudo isto seriam argumentos para que o contrato informal e ilegal perdesse adeptos.

O serviço público do sistema arbitral, eventualmente conjugado com algum sistema privado de seguro seriam estímulos e garantias de fiabilidade do rendimento que poderiam compensar largamente o custo fiscal e/ou em prémios de seguro.

Nada disto é novo, há imensas ideias “importáveis” de mercados de arrendamento maduros e haverá provavelmente sugestões mais razoáveis do que as que aqui sugeri, o que é certo é que julgo que este tema seria bem mais relevante e com impacto directo e inequivoco na nossa economia do que… discutir o sexo dos anjos da constituição da república .

9 comentários

  1. Tendo em conta os preços praticados para o arrendamento imobiliário na zona de Oeiras, compreendo que as pessoas optem por comprar, em vez de arrendar.
    Uma renda para um T2 ou T3 consegue ser igual e, em alguns casos, superior a uma prestação mensal ao banco. E isso verifica-se, independentemente da taxa de juro praticada pelo banco, pois os “spreads” são sempre negociáveis, de forma a equiparar à situação actual, em que a taxa de juro está abaixo do valor do “spread”, ao contrário do que se verificava há 3-4 anos.

    O arrendamento só sobressai nos casos de pessoas/famílias com um futuro planeado a breve prazo, sabendo que vão ficar pouco tempo naquela casa ou para profissões com elevada mobilidade.

    Existe alguma excepção ao designarmos um contrato para habitação de um imóvel? Pensava que só se podia “arrendar” um imóvel, mas vejo muitas pessoas a mencionar “alugar uma casa”.
    Ensinaram-me que só se podem alugar bens móveis e arrendar bens imóveis.
    É um erro dessas pessoas ou, realmente, podemos alugar uma casa?

  2. Tudo parece feito de modo a empurrar as pessoas para comprar em vez de alugar, excepto nos casos já antigos em que o Estado se serve dos proprietários para fazerem o trabalho da Segurança Social. Portugal é um pais pobre com imenso proprietários… de hipotecas. Desafio-vos a escreverem um artigo mostrando quem beneficia com esta situação (autarquias, governos, bancos, urbanizadores, construtores, etc) e expondo o esquema (contabilistico, fiscal, etc) que permite que se continue a construir (muitas vezes autenticos atentados) num pais com mais de meio milhão de casas novas por vender. Também gostava de ver explicada a velocidade com que se vendem tantos imoveis de luxo num pais com tão poucos ricos declarados: quem os compra e com que dinheiro?

    Já agora outra achega ao vosso artigo: uma pessoa que alugue legalmente uma casa está tramada: ao englobar o rendimento do trabalho com conta doutrem com o do aluguer subirá de tal modo nos escalões do IRS que provavelmente terá prejuizo por alugar a casa, somado aos riscos já conhecidos de problemas de inquilinos que com grande impunidade não pagam a renda, destroiem e roubam os equipamentos dos imóveis.

  3. Viva. Carlos o risco para o inquilino advém, por exemplo, dos casos em que rebenta um cano, estoura a instalação electrica, há uma fuga no gás ou avaria um electrodoméstico (caso tenha sido incluido no contrato) e o senhorio se desleixar a produzir a reparação ignorando os termos contratados. Nesse caso o inquilino também pode ter de passar um mau bocado para voltar a ter a casa habitável (ainda que seja sempre mais fácil repercutir efeitos desse “mau comportamento” no senhorio).

  4. Olá Mapari, mas todas as intervenções no INTERIOR da habitação não são de exclusiva responsabilidade do inquilino, se nada se disser em contrário no contrato?

    E caso as situações que enuncia estejam efectivamente contempladas no contrato o inquilino argumentando prejuízos pessoais graves, não se pode substituir ao senhorio, mandando realizar os trabalhos e descontando nas rendas?

    Peço desculpa pela minha ignorância, embora eu já tenha sido ( e continuo a ser ) várias vezes inquilino e algumas vezes proprietário, 99,9% do risco do mercado está do lado do proprietário. Corrija-me se estou enganado, por favor.

  5. Sem prejuizo de concordar que o risco está essencialmente do lado do proprietário, o exemplo que demos procurou confrontar os procedimentos existentes por cá com outros de mercados mais maduros. E há contratos em que correm do lado do senhorio responsabilidades que devem ser atendidas e podme não o ser. O contrato deve deixar claro, por exemplo, no caso de arrendamento com cozinha mobilidade de quem é o ónus de mandar reparar um electrodoméstico. Se ficar a cargo do senhorio, o inquilino poderia ter vantagem em que existisse uma entidade/mecanismo (por exemplo accionar a caução em seu favor) a quem recorrer para pressionar o senhorio a repor com urgência a situação contratual. O abate da despesa nas rendas pode ser uma hipótese, mas pode haver um problema de liquidez/acesso ao crédito por parte do inquilino que o impossibilite de imediato reparar o dano para posteriormente o imputar ao senhorio.
    Enfim, também há margem e justificação para reforçar a segurança do lado do inquilino ainda que, repito, o maior desequilibrio neste mercado esteja claramente do outro lado, em desfavor do senhorio.

  6. Se há uma área em que o comportamento do regime democrático se comportou de forma idêntica ao estado novo, foi nesta área.

    O que se tem feito no mercado imobiliário só tem comparação com a expulsão dos judeus no inicio do século XVI, no que concerne á credibilidade do estado perante os promotores de investimento imobiliário duradouro.

    Felizmente a actual democratização dos proprietários que alugam as suas casas para não as entregarem aos bancos, irá finalmente promover mudanças a este nível que nunca houve coragem politica de implementar tão só porque serão milhares de UNI-PROPRIETÁRIOS, a sofrer na pele aquilo que uma certa classe de proprietários tem sofrido nas ultimas 4 décadas.

    Para muitos já vem tarde, para outros a “guerra ainda só agora começou”. Subscrevo na integra todas as sugestões dadas neste artigo.

  7. Bom dia a todos:

    Quero deixar aqui um testemunho e agredeço desde já a todos que me possam esclarecer neste assunto.
    Celebrei um contracto de arrendamento segundo regime estatuido pelo NRAU pela lei 6/2006 com início a 1 de Julho 2010 com prazo de 5 anos. A senhoria é representante de uma Sociedade Imobiliária que constitui a primeira contraente.
    O que se sucedeu foi que a primeira inspecção de gás realizada dia 15 de Julho tem um relatório de: excesso de monóxido de carbono, fogão com boca de gas estragada, falta de pintura anti-corrosiva e fuga de gás na instalação. Foi imediatamente dado o conhecimento à senhoria que accionou a reparação. Foi cortado o fornecimento de gás e informei que esta situação teria de ser resolvida porque não iria habitar a casa nestas condições.
    Foi dado como resolvido pela equipa de reparação no dia 22 e requeri nova inspecção que me foi disponibilizada pela EDP dia 29. Resultado: reprovado. O monóxido de carbono desapareceu (porque a fonte era a caldeira de 18 anos que foi substituida) mas manteve-se a fuga de gás. O senhorio prontamente retirou a placa de gás e substituiu por uma de vitrocerâmica, anulando essa saída de gás. Deu-me conhecimento de seguida que poderia usufruir da casa em pleno porque tinha resolvido a fuga de gás. Contudo, os serviços tinham selado o fornecimento de gás e não tinha prova de inspecção como aprovado.

    O que sugeri foi a suspensão do contracto entre a 1ª inspecção reprovada e a inspecção em que esteja seja dado como em conformidade com devolução ou crédito da mensalidade correspondente a este periodo. Outra alternativa seria rescindir o contracto com devolução da totalidade do montante dos 2 primeiros meses.
    Pedia a ajuda a quem vier a ler este testemunho se existe alguma incongruencia que possa vir da minha parte e quais são os meus direitos enquanto cliente, porque às vezes não se pode contar com o bom senso.

    Obrigada.

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