Quanto às rendas nos municípios com mais de 100 mil habitantes, os dados do 1º trimestre de 2024 divulgados pelo INE revelam que Gondomar, Maia e Lisboa foram os três concelhos em que as rendas subiram menos quando comparado com o mesmo trimestre do ano anterior, aquilo a que se chama variação homóloga.
A renda usada neste contexto é a renda mediana por metro quadrado dos novos contratos de arrendamento celebrados em cada concelho, ou seja, a renda por metro quadrado que coloca metade de todos os contratos novos celebrados nesse concelho acima desse valor e a outra metade abaixo desse valor.
Se é verdade que Lisboa surge assim como um dos três concelhos, entre os 24 mais populosos, onde as rendas de novos contratos estão a subir menos (medidas pela mediana por metro quadrado) também é verdade que Lisboa continua a ter os valores de renda por metro quadrado mais elevados (€15,25/m2) de entre esses mesmos 24 concelhos. Ainda asim merece destaque que concelhos com custos de arrendamento por metro quadrado muito próximos dos valores de Lisboa (como Cascais €14,47/m2) continuam a registar aumentos das rendas acima da média nacional (para novos contratos), com crescimentos de dois dígitos, acima de 10% face a 2023 enquanto Lisboa (4,9%) está já bem abaixo da media nacional (10,5%) com crescimentos inferiores a metade dos registados, por exemplo, em Cascais (10,9%).
A subida de 4,9% registada em Lisboa, ocorre, apesar de tudo, a um ritmo superior ao do aumetno dos preços no consumidor e, provavelmente, acima do ritmo de aumento da maioria dos salários.
Um outro destaque interessante resulta de constatar que o concelho de Lisboa está inclusive a destacar-se do comportamento da região “Grande Lisboa” em que se insere. Na Grande Lisboa as rendas cresceram quase ao dobro do ritmo do verificado no concelho da capital. Neste sentido, as diferenças de Lisboa não ocorrem apenas “contra” Cascais.
O que estará a justificar esta diferença significativa de evolução dos preços?
Umas das possíveis explicações prende-se com a existência de um contingente elevado de casas que estavam destinadas a Alojamento Local no concelho de Lisboa (portanto, fora do mercado de arrendamento), casa essas que poderão ter saído dessa atividade e entrado no mercado de arrendamento clássico por via dos incentivos de política pública associado ao programa Mais Habitação que, recorde-se, entre outros, impôs políticas fiscais penalizadoras ao Alojamento Local e reduziu a fiscalidade ao Arrendamento clássico, em especial de média e longa duranção (entre outros).
A prova desta especulação é difícil pela curta duração das medidas e pelo curto espaço de tempo que tiveram para mostrarem a sua eficácia, mas há evidências de que algo pouco comum e rápido mudou no mercado de habitação em Lisboa entre o final de 2023 e os primeiros meses de 2024, em especial, em concelhos onde o Alojamento Local tem expressão.
Esta suspeita foi-nos despertada por artigos como este do Portal Idealista, plataforma especializada no mercado imobiliário e de arrendamento: “Arrendar casa em Portugal: oferta dispara 81% no início de 2024“.
Que outros indícios encontramos na informação do INE agora divulgada?
Mas centremo-nos no INE. Que outros indícios encontramos na informação do INE? Um deles é que o concelho do Porto, outro com expressão significativa do Alojamento Local e com rendas medianas acima da média nacional surge em 4º posição entre os concelhos com menores subidas homólogos das rendas.
Por outro lado, Lisboa registou ao longo dos primeiros três trimestres de 2023 uma queda média do número de novos contratos assinados de 12,2% em termos homólogos. No entanto, desde que o Mais Habitação entrou em vigor a evolução passou para uma queda homóloga de apenas 0,5% com o último trimestre de 2023 a registar inclusive um aumento da oferta de casas para arrendar. No Porto, o último trimestre de 2023 e o primeiro de 2014 (já com o Mais Habitação em vigor) trouxeram um crescimento dos contratos de arrendamento celebrados superior ao que vinha sendo habitual. Curiosamente, em Cascais sucedeu o oposto, a concretização de contratos de arrendamento no último trimestre de 2023 e primeiro de 2024 registou valores médios piores do que os que vinham sendo apurados.
Tudo isto são, contudo, indícios insuficientes para avaliar a eficácia das medidas do Mais Habitação num dos seus objetivos: trazer mais casas para o mercado de arrendamento ou de compra e venda e interromper a escalada aparentemente imparável das rendas e dos preços das casas à venda. Estas medidas do Mais Habitação deixaram de estar em vigor perto do final do segundo trimestre de 2024 pelo que ainda será interessante avaliar os próximos dados do INE com este objetivo.
Uma coisa parece certa, mesmo que podendo ter alguma eficácia na contenção da escalada dos preços e numa melhoria na evolução da oferta de casas para arrendar, a eventual transferência de habitação do turismo (Alojamento Local) para o mercado de arrendamento ou mesmo de compra e venda será apenas uma peça de uma engrenagem complexa que exigirá medidas de curto, médio e longo prazo para ser enfrentada.
No mesmoo sentido, o fim dos incentivos negativos/positivos que visavam favorecer o arrendamento de longo prazo face ao Alojamento Local poderá ter algum impacto na degradação futura da situação deste mercado que, segundo dados recentes, enfrenta a sua pior crise (do ponto de vistas dos residentes) em Portugal, face aos nossos restantes 27 parceiros europeus, isto sem prejuízo de também ser um problema muito sério noutras geografias.
A este propósito destacamos a peça da SIC:
Portugal é o país da UE onde a dificuldade em comprar casa mais aumentou