Execução orçamental junho 2016

Como pode a execução orçamental estar a correr tão bem?

Quem nos acompanha há alguns anos na análise à síntese de execução orçamental saberá que antes dos últimos meses de cada ano e por vezes mesmo antes do fecho de contas em março podemos ter surpresas, geralmente desagradáveis. Tipicamente, só mesmo a partir dos dados do primeiros semestre é que nos vai parecendo razoável avançar com algum comentário mais ousados quanto ao que esperar para o ano completo. Atendendo à difusão da execução orçamental junho 2016, face a 2016 estamos precisamente nesse momento.

 

Como pode a execução orçamental estar a correr tão bem?

Mas está mesmo a correr “tão bem”? A verdade é que as expectativas também contam para qualificar de bom ou mau. É contra as expectativas, sejam as explícitas no Orçamento do Estado, sejam as dos restantes cenários macroeconómicos que vão sendo divulgados que se definem os qualificativos em cada caso e a cada momento. Quanto à execução orçamental de 2016, a proposta do Orçamento do Estado é ambiciosa (défice a fechar nos 2,2% a 2,3%). A verdade é que durante boa parte do semestre as considerações públicas de centros de investigações, organizações internacionais mais ou menos politizadas e partidos da oposição foram predominantemente próximas do catastrofismos tendo contribuído para baixar as expectativas.

 

Execução orçamental junho 2016
Fonte: DGO

 

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Talvez por isso tenha existido alguma surpresa aquando do primeiro sinal claramente animador que surgiu não com base na síntese do governo, mas com base nas estatísticas oficias apuradas pelo INE relativas ao défice em contabilidade nacional,  o que conta para Bruxelas, relativo ao primeiro trimestre.

Este indicador, antecipado pela UTAO e mais tarde confirmado de forma oficial pelo INE colocou o défice público num patamar muito inferior ao registado em igual período de 2015 (5,8% compara com 3,2%) e permitiu alimentar a perspetiva de que era possível atingir um défice próximo do projetado mesmo com indicadores cada vez mais evidentes de desaceleração da atividade económica a nível nacional e internacional. Contudo, a indicação era ainda muito preliminar, e, sendo certo que este indicador não goza de tantas vulnerabilidades quanto o défice em contas públicas (aquele que é calculável tendo por base a execução orçamental mensal) esse valor permitiu rejeitar a certeza da mensagem catastrofista mas não permite ainda falar com certeza sobre o que acontecerá dos restantes três trimestres do ano.

Entretanto foram divulgados mais três meses de execução orçamental e no final de setembro conhecer-se-á o valor oficial do défice em contas nacionais do segundo trimestre de 2016. Enquanto esse valor não é apurado, o que nos dizem as contas públicas na ótica de caixa já reveladas?

 

Execução Orçamental junho 2016

Os dados de junho dizem-nos que o patamar de pagamentos adiados é elevado mas mais baixo do que em período comparável em 2015. Dizem-nos também que o atual nível do défice em contas públicas é extraordinariamente baixo não sendo credível que se mantenha com este perfil face ao resto do ano. Por outras palavras, é suposto o défice em contabilidade pública, medido em euros, ser superior ao de 2015 em cerca de €900 milhões e em juho de 2016 está abaixo do valor de 2015 em €971 milhões.

Como é que isto se explica? A despesa está de facto num patamar de evolução muito inferior ao orçamentado. A despesa com consumos intermédios está particularmente baixa, bem como o investimento público, as despesas com pessoal não atingiram o patamar de crescimento antecipado (e note-se que já incluem metade do valor das reposições salariais na função pública previsto para a totalidade do ano). Adicionalmente, haverá alguma despesa que terá inevitavelmente de se fazer (como o pagamento de algumas indemnizações compensatórias) que estará com um perfil anual diferente do de 2015, devendo surgir um pouco mais tarde o que inevitavelmente fará aumentar o ritmo de crescimento da despesa que está por agora nos 0,2%.

Do lado das receitas o Imposto Sobre os Produtos Petrolíferos surge em destaque com um forte e esperado aumento, mas também outros impostos começam a dar frutos (note-se que o orçamento só entrou em vigor em abril). O imposto de selo – que aumentou sobre a prestações de crédito, por exemplo – só em junho parece estar a subir de forma significativa (passando de 5,5% para 10,2% entre maio e junho em termos homólogos) e o Imposto Municipal sobre as Transações de imóveis continua a crescer a um bom ritmo à boleia da ressurreição do mercado imobiliário.

Por outro lado, há perda de IRC ainda justificada pela antecipação de receitas em 2015 associada a uma alteração fiscal nos fundos de investimento e há perda de IRS à conta de um volume de reembolsos muito expressivo e surpreendente associado ainda à reforma do IRS de 2015.

 

O que se pode esperar nos próximos meses?

Há várias dúvidas e indicações contraditórias que dificultam a antecipação do resultado final. Sobre a despesa haverá maior pressão por via da conclusão das reposições salariais nas administrações públicas. Do lado da receita é provável uma quebra do IVA no segundo trimestre associada à redução da taxa nos produtos alimentares afetos à restauração.

Ao nível da Segurança Social têm predominado as boas notícias e é possível que com um bom ano turístico, alguma consolidação de postos de trabalho (antes supridos sobre formas mais precárias), os primeiros frutos das novas iniciativas de combate à fraude e pelo próprio efeito de aumento das contribuições associado à reposição salarial o resto do ano mantenha o perfil positivo.

Sem querermos ser exaustivos, há ainda dois efeitos potenciais que poderão ou não ter impacto no défice e que não são diretamente imputáveis à execução  ou à governação orçamental propriamente dita:  as consequências sobre a atividade económica associadas à incerteza política internacional (Brexit e sanções) e a provável necessidade de nova intervenção na banca que poderá ou não ser considerada despesa pública dependendo do modelo de intervenção e das interpretações das instituições europeias responsáveis pelas convenções contabilísticas.

 

Em que ponto estamos?

A incerteza é ainda grande mas é hoje inequívoco que o défice em contas públicas terá de aumentar nos próximos seis meses, a menos que algo de inesperado e de muito positivo suceda ao nível da receita e da atividade económica. Sem esse fenómeno não antecipável neste momento, o défice em contas públicas irá aumentar pelas razões já explicitadas. No entanto, atendendo ao ponto com que partimos para a segundo semestre (na prática uma “folga” de cerca de €1900 milhões face ao orçamentado) é razoável afirmar que esse aumento nominal do défice pode perfeitamente ser compatível com o objetivo de défice estabelecido para 2016, algo que será ainda mais credível se se considerar o objetivo de segunda ordem que será a saída do procedimento de défices excessivos que exige, entre outros, um défice em contas nacionais inferior a 3%.

Uma última nota para acompanhar os próximos meses e, em especial, o próximo valor oficial do défice em contas nacionais. Para facilitar as comparações quando em setembro o INE vier a divulgar a primeira estimativa do défice em contas nacionais para o segundo trimestre de 2016 recordamos que em setembro de 2015 o INE antecipou um défice no trimestre de 4,7%. Mais tarde viria a rever tanto o primeiro trimestre como o segundo trimestre em baixa para 5,5% e 3,9%, respetivamente.

 

Mais informação:

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