Num artigo de opinião no Negócios, o jornalista Rui Peres Jorge que vem acompanhando a política económica nacional e europeia há vários anos (em particular de uma perspetiva macroeconómica), enuncia um conjunto de factos que sustentam a utilidade de se discutir a reestruturação da dívida, balizando essa discussão como algo que nos deve guiar entre dois extremos que acredita poderem garantir-nos uma década perdida: o extremo de querer pagar dívida a todo o custo e o extremo de confiar na resolução do problema apenas por crescimento.
Do artigo “Por que devemos debater reestruturações” cuja leitura recomendamos na íntegra, em particular as conclusões que o jornalista retira dos factos, reproduzimos aqui, precisamente, os factos que valoriza.
Após dias de reações exacerbadas, adjetivações inusitadas e acusações tomando por referência o caráter dos subscritores do manifestos dos 74 que inundaram vários editoriais de jornais nacionais, inclusive da imprensa especializada em economia, a reflexão que encontrámos neste artigo de opinião de um observador privilegiado sobre este tema é um contributo de valor para que se resgate alguma sanidade e equilíbrio para esta discussão inevitável.
O excerto:
“(…) • A dívida pública portuguesa atingiu os 130% do PIB no final de 2013, o que coloca Portugal como o sexto país do mundo com maior peso de dívida (à frente estão Japão, Grécia, Líbano, Jamaica e Itália). A média da Zona Euro está nos 90%, já superior aos máximos registados no pós-Segunda Grande Guerra;
• A factura de juros da actual dívida ronda os 4,5% do PIB ao ano. Para cumprir o compromisso europeu mais básico, Portugal terá de caminhar para um excedente orçamental antes de juros na casa dos 4% do PIB nos próximos anos, e de 3% na década seguinte, valores nunca registados no Portugal democrático e difíceis de encontrar na Europa nas últimas décadas. Acresce que o envelhecimento populacional pressiona cada vez mais as contas e as perspectivas de crescimento não são animadoras;
• Todos, mesmo a troika, concordam que para a dívida pública ser sustentável, será central que a economia cresça próximo dos 4% em termos nominais (2% em termos reais), num momento em que decorre todo um debate internacional sobre a possibilidade de termos entrado numa fase de baixo crescimento permanente nas economias avançadas;
• Na frente privada, as empresas e as famílias devem cerca de 280% do PIB, do qual 165% está por conta das empresas, que ocupam o quarto lugar, no ranking da Zona Euro. Para manter o “stock” de dívida privada constante, seria necessário que o sector privado crescesse quase três vezes mais do que a taxa de juro, num contexto de bancos com prejuízos e custos de financiamento especialmente elevados;
• Finalmente, entre 1970 e 2008, mais de 80% dos casos de incumprimento em países de rendimento médio aconteceram com níveis de dívida externa (privada e pública) inferiores a 80% do PIB. Entre 1970 e 2000, a média da dívida externa nas economias avançadas foi de 55% do PIB. No final do ano passado, Portugal devia ao exterior mais de 250% do PIB – quase cinco vezes mais. (…)”