Há pouco mais de 20 dias, o INE apresentou o procedimento de défices excessivos onde fixava o valor do défice dos últimos 4 anos em valores significativamente acima do inicialmente projectado, invocando-se na altura o ajustamento interpretativo de algumas despesas até ali não consideradas como uma parte da factura com o BPP, BPN e a dívida de empresas de transportes como a Refer , o Metro de Lisboa e o Metro do Porto. Relatámos o assunto do artigo: “INE e Eurostat revêem em alta défice do Estado dos últimos 4 anos“.
Invocando o período de três semanas no qual as autoridades nacionais e internacionais competentes, procedem à apreciação da notificação inicial feita, o INE veio rever de forma muito importante o valor do défice de 2010 (e, em menor escala, do anos anteriores):
“(…) A revisão efectuada determinou um aumento da necessidade de financiamento e da dívida das Administrações Públicas, respectivamente, em 0,5 e em 0,6 pontos percentuais do PIB em relação aos valores apurados para 2010 na notificação inicial.”
Não temos memória de uma revisão desta natureza no passado (mas pode ser um problema da nossa memória) e as justificações apresentadas pelo INE (e aceites pelo Eurostat) são algo… desconfortáveis. Uma auditoria privada geralmente, quando não tem certeza de algo, apresenta reservas no momento em que subscreve umas contas, INE e Eurostat, ao não o terem feito com clareza, colocam-se agora numa situação difícil de explicar. Afinal, as contas são analizadas de acordo com graus de exigência e detalhe que podem variar significativamente.
Atendendo ao comunicado do INE invoca-se que aquando da visita diálogo do Eurostat realizada no início do ano algumas questões “ficaram para análise posterior tendo como objectivo que o Reporte de Outubro de 2011 pudesse já reflectir os resultados dessa análise“. Ou seja, assume-se (agora publicamente) que poderia haver mais qualquer coisa mas deixava-se para apreciação até Outubro. O que mudou? O que mudou foi que, entretanto, Portugal pediu ajuda à troika e esta exigiu que tudo fosse esclarecido imediatamente, algo que se conseguiu fazer em apenas 3 semanas e não nos esperados 6 a 7 meses.
E da tal apreciação das questões apurou-se que estava tudo bem contabilizado excepto algumas Parcerias Público-Privadas que afinal:
“De facto, após análise detalhada de um elevado número de contratos de grande complexidade, concluiu-se que três deles (dois dos quais correspondendo a contratos renegociados de ex-SCUT) não têm a natureza de contratos PPP em que o investimento realizado é registado no activo do parceiro privado. Naqueles três contratos, os utilizadores estão sujeitos a um pagamento pelos serviços prestados numa proporção significativa relativamente ao pagamento de disponibilidade desses serviços pelas Administrações Públicas (que integram, em Contas Nacionais, a Empresa Pública Estradas de Portugal) à contraparte privada. (…)
Em concordância com o Eurostat, este assunto encontra-se agora totalmente clarificado de acordo com o seguinte princípio: quando os utilizadores finais pagam a maioria do custo do serviço, o investimento realizado deve ser registado no activo da unidade institucional que recebe esses pagamentos.
Uma vez que as portagens constituem receita das Administrações Públicas, os activos integrados nestes contratos são considerados investimento das Administrações Públicas, afectando em consequência a respectiva necessidade de financiamento. Com efeito simétrico neste saldo, em Contabilidade Nacional, a componente dos pagamentos futuros das Administrações Públicas que visam compensar a contraparte privada nestes contratos pelo investimento realizado, não serão considerados. Ou seja, com esta alteração, ao aumento do défice no passado está associado o efeito da redução do défice no futuro comparativamente ao que aconteceria caso estes contratos fossem tratados como PPP. (…)”
Este artigo do Negócios permite perceber um pouco melhor os meandros contabilísticos que justificam esta revisão: “Défice de 2011 beneficia com novas contas para as PPP“
Entretanto publicámos um outro artigo sobre o assunto: “Substituição das SCUTS por portagens tramam o défice“.
Défice 2007: 3,1%
Défice 2008: 3,5%
Défice 2009: 10,1%
Défice 2010: 9,1%