O sistema dos pensões de reforma é um dos temas recorrentes e geradores de debate mais apaixonado em Portugal. Por estes dias ganha novo fôlego com sucessivas notícias que estabelecem uma ligação entre a Segurança Social e Caixa Geral de Aposentações. Fará sentido?
O sistema da Segurança Social está há vários anos a acumular um saldo positivo que é canalizado para a almofada financeira (Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social – FEFSS) que se tem vindo a constituir para acudir, no futuro, a anos onde o total das contribuições pagas não seja suficiente para pagar as pensões devidas.
Atualmente, se todas as contribuições desaparecessem – o que nunca acontecerá pois haverá sempre quem esteja a trabalhar e a contribuir – esse fundo seria suficiente para suportar sozinho dois anos de pensões a todos os reformados.
Neste momento, o cenário é positivo, seja porque os níveis de emprego estão elevados (há mais contribuintes a financiar), seja porque o salário médio tem vindo a subir (há mais volume de contribuições). Na Segurança Social, por regra – com algumas exceções- o trabalhador contribui com 11% do seu salário mensal e a entidade patronal com 23,75% através da taxa social única (TSU).
Estes valores são usados para pagar as pensões do mês mas também para suportar outras despesas da Segurança Social como os subsídios de doença dos trabalhadores, o subsídio de desemprego, as prestações de parentalidade, entre outros.
Segurança Social e Caixa Geral de Aposentações qual delas tem prazo de validade?
A Caixa Geral de Aposentações foi criada especificamente para os funcionários públicos durante o regime salazarista e durante décadas o Estado apropriou-se das contribuições não criando nenhuma almofada e gerindo o pagamento de pensões com transferências do Orçamento do Estado.
Em 2006 este sistema foi fechado a novos contribuintes, estando há 19 anos nessa situação. Para quem ainda está na CGA (os que entraram até 2006), a CGA estará obrigada a assumir o pagamento das pensões até que estes participantes se reformem e acabem por falecer. Durante este período de algumas décadas, o CGA será deficitária.
Os novos funcionários públicos passaram a descontar para a Segurança Social e será pela Segurança Social que irão receber as suas reformas.
Assim, apesar da Segurança Social e da CGA terem sistemas de pensões associados, a sua realidade é muito distinta. E a relação mais forte é a de que lidam com… dinheiro.
Mas a sua natureza e os seus problemas são distintos. De certa forma são como água e azeite. Uma viva e a atravessar um ciclo muito positivo que está a usar para se preparar para lidar com ciclos futuros menos positivo, e a outra que já está congelada há 19 anos, não foi gerida com o propósito de ser autossustentável e que terá de ser financiada com recursos alheios até acabar por se extinguir naturalmente.
A Segurança Social é hoje o sistema de pensões universal
Hoje a Segurança Social é o único regime em vigor para funcionários públicos e trabalhadores do setor privado, apresentando excedentes e possuindo mecanismos de sustentabilidade que garantem que todos os seus participantes terão direito a uma pensão quando se reformarem (sem prejuízo de poderem existir fundos de pensões privados).
Já a CGA é um sistema fechado, do Estado enquanto entidade patronal, que irá desaparecer em algumas décadas, encontrando-se em défice crónico, défice esse que a entidade patronal (Estado) terá de financiar anualmente, emendando algumas imprevidências que cometeu ao longo de quase 100 anos (a CGA foi fundada em 1929).
Mais sobre a Segurança Social e o futuro
O sistema atual tem mecanismos de ajustamento e sustentabilidade que são conhecidos. Um passa pelo aumento da idade da reforma se a esperança de vida aumenta (ou de descida se esta diminuir como aconteceu com o covid), outro passa flexibilidade na definição da taxa de substituição de salário por pensões (todos terão pensão no futuro mas poderá ser um pouco, medianamente ou muito menor face ao último salário que irão receber antes da reforma). Há ainda o já referido FEFSS – a almofada financeira – que está a reservar os excedentes atuais e mais algumas contribuições (como os valores do adicional do IMI, e uma pequena contribuição do IVA) para usar no futuro quando se registarem défices.
Uma discussão muito relevante associada à transformação da economia passa por encontrar uma lógica que deixe de centrar inteiramente as contribuições nos trabalhadores e no custo com o pessoal por parte das empresas.
Recentemente o Livro Verde do Futuro da Segurança e Saúde no Trabalho da Segurança Social sugeriu que a contribuição patronal para a Taxa Social Única (23,75% sobre o salário bruto) pudesse ser substituída por uma taxa sobre o valor acrescentado líquido da empresa.
Esta mudança iria permitir que se estabelecesse uma associação do esforço contributivo à intensificação do uso de tecnologia e outros métodos de produção altamente produtivos, que permitam às empresas acrescentar valor à economia (depois de descontados os custos e outros impostos).
Não deixando de ter algumas desvantagens, esta proposta permitiria ancorar as contribuições à geração de riqueza, seja ela mais ou menos associada ao fator humano.
No fundo, garantiria que se a economia cresce e se a sociedade enriquece, não se criaria um paradoxo com uma civilização cada vez mais rica e com a maioria dos seus membros cada vez mais pobres. As pessoas teriam garantida uma parte dessa vantagem global por via da sua reforma.
Na prática, em empresas muito mais lucrativas que até possam ter menos trabalhadores poderiam representar um volume de contribuições comparável ou superior ao que é recolhido junto de empresas com mais mão de obra mas com menor valor acrescentado líquido. Os trabalhadores, esses, continuariam a contribuir com uma percentagem do seu salário.
Este tema será garantidamente fonte de um debate renovado ao longo do próximo ano que procuraremos acompanhar.
Melhor no regime de contribuições e pensões é um jogo com alto risco.
Deixem as contribuições tal como está, ou seja, proporcional aos salários. Quando muito façam repartir de igual modo as contribuições pelo trabalhador e pelo empregador. Como noutros países, tal como a Alemanha.
Outra medida certa seria autonomizar a Segurança Social das contas do Estado (orcamento).
Ou ainda limitar os descontos a um plafond assim como o valor máximo da pensão.
Ainda positivo seria criar um sistema fo tipo ADSE para todos os que trabalham, cobrando 3.5% a cada trabalhador (com um limite máximo do salario (por exemplo 12x o IAS).