Qualquer contrato firmado à distância (por telefone ou plataforma digital ou em contacto feito fora da loja do operador/fornecedor) está abrangido por um período de livre resolução no qual não é preciso dar-se satisfações para se cancelar o contrato, contudo, na prática a situação não é tão linear. Segundo o decreto-lei nº24/2014 de 14 de fevereiro (que transpõe legislação comunitária) esse período é de 14 dias seguidos. Naturalmente, as obrigações do fornecedor e do cliente adaptam-se aos casos em que o contrato incide sobre bens ou sobre serviços mas quando se trate de uma contratação de prestações de serviços (por exemplo serviços de telecomunicações – tv, internet fixa, internet móvel, telefone, telemóvel) há também deveres para o consumidor mesmo que este cancele ou termine (sinónimo para resolva) o contrário dentro do prazo. Ou seja, a resposta à pergunta “Novos contratos de telecomunicações deixaram de ter período de cancelamento sem custos?” não é unívoca mas, por regra e na prática, diríamos que sim. É sobre os contratos de prestação de serviços que acrescentaremos mais alguns detalhes nas linhas que se seguem.
Mas em que situações há obrigação de pagamento e que pagamento?
Se bem entendemos a lei (cuja leitura e interpretação profissional não se dispensa após a leitura este nosso texto) a responsabilidade de algum tipo de pagamento só existirá se, de facto, o novo operador com que tínhamos acabado de contratado o serviço – depois de ter recebido documento em suporte duradouro por parte do cliente expressando o início da prestação de serviço – já tiver tido despesas, ou seja, se por exemplo já iniciou a prestação do serviço ou se já iniciou a sua instalação. Nesse caso poderá exigir a cobrança proporcional às despesas incorridas. Sendo certo que aqui poderá haver margem para abusos e necessidade de confronto caso o cliente considere o custo imputado excessivo, parece decorrer da legislação que há de facto um direito do operador a ser ressarcido.
Mas haverá sempre uma obrigação de pagamento?
Imagine que é contactado por um operador de telecomunicações A que lhe faz uma proposta mais vantajosa do que a que tem atualmente e aceita o contrato. Ato contínuo contacta o seu atual operador B para comunicar que vai cancelar o serviço e este faz-lhe uma proposta ainda mais vantajosa. Perante esta evolução dos acontecimentos resolve não cancelar o contrato com B e decide sim, contactar de imediato o operador A com quem tinha acabado de firmar contacto para dizer que se arrependeu e que vai manter-se com o seu operador atual. Neste caso, muito dificilmente haverá justificação aceitável para que o consumidor tenha de pagar o que quer que seja ao operador com que por breves minutos ou mesmo horas ou dias, tenha estado vinculado. Isto se a situação não tiver ido além de mais do que do contacto telefónico/ou por plataforma digital sem mais intervenções (ou seja incício da prestação do serviço).
Note que se o operador A resolveu iniciar a prestação de serviços antes de terminado o període de 14 dias em que dura o direito de livre resolução sem que para tal tenha sido expressamente instruído pelo cliente através de documento duradouro (não estamos certos sobre o que se entende por documento duradouro, mas prudentemente, na dúvida, é possível que uma gravação sonora possa ser bastante) o consumidor não deve ser responsabilizado por qualquer despesa caso cancele o contrato dentro do prazo de 14 dias consecutivos desde o compromisso inicial. Caso o consentimento tenha sido dado o clietne estará a prescindir do período de resolução.
Deixamos aqui dois excertos do decreto-lei nº24/2014, o primeiro do preâmbulo e o segundo do articulado (sublinhados nossos):
“(…) O direito de livre resolução — direito igualmente harmonizado na Diretiva — encontra-se regulamentado de igual modo nos contratos celebrados à distância e nos contratos celebrados fora do estabelecimento comercial, sendo o prazo para o respetivo exercício, de 14 dias seguidos.
Para facilitar o exercício deste direito, o fornecedor de bens ou prestador de serviços deve fornecer ao consumidor um formulário de livre resolução cujo modelo se encontra no Anexo ao presente decreto-lei.
Ainda quanto ao direito de livre resolução, estabelece-se que, nos casos em que o consumidor pretenda que a prestação do serviço se inicie durante o prazo em que decorre o exercício daquele direito, o prestador do serviço deve exigir que o consumidor apresente um pedido expresso através de suporte duradouro, sendo que se o consumidor, ainda assim, vier a exercer o direito de livre resolução deve pagar um montante proporcional ao que for efetivamente prestado (…)”
“(…) Artigo 15.º
Prestação de serviços durante o período de livre resolução
1 — Sempre que o consumidor pretenda que a prestação do serviço se inicie durante o prazo previsto no artigo 10.º, o prestador do serviço deve exigir que o consumidor apresente um pedido expresso através de suporte duradouro.
2 — Se o consumidor exercer o direito de livre resolução, após ter apresentado o pedido previsto no número anterior, deve ser pago ao prestador do serviço um montante proporcional ao que foi efetivamente prestado até ao momento da comunicação da resolução, em relação ao conjunto das prestações previstas no contrato.3 — O montante proporcional a que se refere o número anterior é calculado com base no preço contratual total.
4 — Se o preço total for excessivo, o montante proporcional é calculado com base no valor de mercado do que foi prestado.
5 — O consumidor não suporta quaisquer custos:
a) Relativos à execução dos serviços durante o prazo de livre resolução, se:
i) O prestador do serviço não tiver cumprido o dever de informação pré-contratual previsto nas alíneas h) ou j) do n.º 1 do artigo 4.º, ou
ii) O consumidor não tiver solicitado expressamente o início do serviço durante o prazo de livre resolução; ou
b) Relativos ao fornecimento, na totalidade ou em parte, de conteúdos digitais que não sejam fornecidos num suporte material, se:
i) O consumidor não tiver dado o seu consentimento prévio para que a execução tenha início antes do fim do prazo de 14 dias referido no artigo 10.º,
ii) O consumidor não tiver reconhecido que perde o seu direito de livre resolução ao dar o seu consentimento, ou
iii) O fornecedor de bens não tiver fornecido a confirmação do consentimento prévio e expresso do consumidor.
6 — O presente artigo aplica-se aos contratos de fornecimento de água, gás ou eletricidade, caso não sejam postos à venda em volume ou quantidade limitados, ou de aquecimento urbano. (…)”
ADENDA/Correção: Nos contratos não firmados à distância ou fora do estabelecimento comercial do operador, o período de de livre resolução não é obrigatório ficando ao critério do fornecedor aplicá-lo ou não.