Os meus depósitos a prazo estão em risco? Antes das respostas, eis um pedaço da história recente:
Pela primeira vez na história da zona euro que, recorde-se, foi definitivamente instituída em 1999, um dos sistemas financeiros dos seus estados membros está a ser forçado a taxar de forma extraordinária não os juros mas o capital depositado junto dos seus bancos. É o que está a acontecer em Chipre um país que foi autorizado a entrar na zona euro em 2008 quando, sublinhe-se, já tinha um total de ativos no sector bancário cerca de cinco vezes superior ao PIB gerado num ano. Chipre, um paraíso fiscal devidamente reconhecido e autorizado pelos seus pares, destino preferencial de muitos depósitos externos, tem visto o seu sistema financeiro sofrer fortes perdas e stress provocado pelas sucessivas ondas de choque da crise financeira internacional. Desde os primeiros perdões da dívida na Grécia (país com o qual há uma forte interligação financeira) que é considerado inevitável alguma forma de reconhecimento de perdas e bailout em Chipre. O processo de negociação com os parceiros da zona euro tem durado largos meses e veio a conhecer um desfecho já em período de plena pré-campanha eleitoral na Alemanha e após sucessivas provas de fracasso relativamente a vários outros formatos de bailout testados em outros países europeus.
Invocando uma singularidade peculiar em Chipre e, segundo notícias da imprensa internacional das últimas horas, face à pressão do sistema bancário alemão, dos seus políticos mas também no novo coordenador do Eurogrupo apoiado por alguns países, Chipre foi sucessivamente confrontado com vários cenários que implicavam um confisco substancial dos depósitos a prazo por forma repartir com os seus parceiros o esforço de estabilização do sistema bancário. Só com cortes nos depósitos haveria empréstimos da Zona Euro e do FMI que permitissem evitar o colapso total do sistema financeiro cipriota. Após cerca de 10 horas de negociação os planos iniciais que impunham um forte corte nos depósitos terminou nos moldes até agora conhecidos que passam por um corte de cerca de 10% nos depósitos acima dos €100.000 e um corte ligeiramente inferior (6,75%) nos restantes. Ignorando o potencial efeito de quebra de confiança no sistema financeiro por parte dos particulares à escala europeia, a decisão tomada em relação a Chipre pode encontrar argumentação que a sustente, contudo, o referido potencial de quebra de confiança é um risco que pode ter sido demasiado elevado para ter sido incorrido.
É precisamente no segundo ramo dos cortes (os que se aplicam sobre quem detém até €100.000) que se concentram as críticas mais consensuais. Segundo alguns relatos, o próprio Banco Central Europeu terá considerado não recomendável afetar os depósitos até aos €100.000. Recorde-se que €100.000 é o valor mínimo de referência para todos os fundos de garantia de depósitos dos países da Zona Euro. Um valor harmonizado depois de em 2008 ter existido um risco real de fuga de capitais rumo aos países que ofereciam as maiores garantia.
O principal receio é de que não só em Chipre mas em países como Portugal, Espanha, Itália e Grécia, os depositantes percebam que a salvaguarda dos depósitos até aos €100.000 seja instrumental de qualquer nova necessidade de acordo com os parceiros da Zona Euro e não um valor seguro e garantido até às últimas consequências. O mesmo efeito poderá suceder entre quem tenha poupanças acima dos €100.000, naturalmente.
Qualquer movimento significativo de fuga de capitais destes países pode colocar em perigo a própria sustentabilidade do todo o sistema financeiro tendo um potencial de gerar um problema sistémico de consequências difíceis de antecipar e travar.
As próximas semanas exigirão uma atenção redobrada no acompanhamento da evolução dos ativos deixados à guarda do sector bancário.
Haverá mais situações destas?
Aparentemente, fatores como o peso intrínseco de cada país no seio do Eurosistema e o potencial para poder provocar dano entre os seus parceiros será um fator decisivo para qualquer toma da de decisão. Ou seja, uma lógica puramente nacional onde os países que, no presente contexto histórico, têm mais poder sobre os restantes ditam os termos e não têm receio de implementar medidas que podem pôr em causa os fundamentos da confiança entre os membros da zona euro.
Os meus depósitos a prazo estão em risco?
É inegável que se pode ter aberto uma caixa de Pandora. Hoje já não é possível dizer que os depósitos a prazo na Zona Euro até aos €100.000 estão a salvo de qualquer corte a confirmarem-se os termos da proposta do Eurogrupo. Seguramente,e os depósitos terão um risco muito diferenciado dentro da zona euro dependendo do país em que estão localizados. Algo que já existia antes destes desenvolvimentos em Chipre mas que aumentou de forma comprovada com este episódio.
Em suma, aumentaram, objetivamente os incentivos racionais para não concentrar poupança em países pequenos ou médios (à escala europeia) que estejam particularmente dependentes do apoio dos seus parceiros para evitarem um cenário de bancarrota.
Significa isto que devo levantar todos os meus depósitos?
Não necessariamente. Estamos a falar de um risco acrescido, não estamos a descrever um cenário certo, nem sequer um cenário de perda total do valor depositado. Mesmo imaginando como certa uma perda igual à prevista em Chipre de cerca de 6,75% há custos significativos em muitas alternativas de investimento face a um depósito a prazo. Por exemplo, a compra de outros ativos ou mesmo de bens valiosos pode facilmente, fruto da volatilidade associada, representar num curto espaço de tempo, perdas superiores ao valor potencialmente em risco nos depósitos a prazo. Por outro lado, um depósito num banco de um estado “seguro” tipicamente tem de se fazer no estrangeiro e pode exigir residência nesse país acarretando também custos que numa poupança de até €100.000 pode não se justificar.
A recomendação genérica que fazemos será a de que se diversifique a carteira de investimento de ativos de baixo risco.
- Sim, ter mais algum capital fora do sistema financeiro pode fazer sentido, seja com reserva no ‘colchão’, seja num cofre bancário.
- Sim, deter alguma parte da poupança em outras moedas ou valores pode fazer sentido, escolhendo criteriosamente o investimento e tendo consciência de que há sempre risco inerente (cambial, roubo, etc).
- E sim, há incentivos também muito fortes internos e externos para que não se instale a desconfiança generalizada entre os cidadãos face ao sistema financeiro pelo que apesar de mais arriscado, ter o dinheiro depositado no banco e a gerar um rendimento real positivo como acontece agora em Portugal continua a ser uma opção de poupança legítima e defensável. Pelo sim, pelo não, ponha alguns ovos noutros cestos, mas não deite a opção dos depósitos bancários para o lixo das suas opções de aforro.
Bons negócios!
É o descalabro total! NUNCA MAIS alguém vai ter confiança no sistema e a Europa vai-se apagar lentamente até à sufocação final!
Minha rica Suiça!!
Não será precoce estarmos a alarmar com uma situação que:
– não está ainda definida, até podendo os depositos até 100 mil euros serem isentos dessa taxa
– passou-se num país que é um caso especial
– já foi confirmada que não acontecerá em Portugal.
Parem lá com as especulações que já há especuladores a mais neste planeta!
O que o jz diz ser especulação para nós é informação. Saber o que se está a passar incluindo o grau de incerteza associado é um direito. Aliás, se há quem esteja a introduzir incerteza em tudo isto, não é seguramente o mensageiro.
È especulação pura, caro Mapari.
Grau de incerteza?? Mas se já foi confirmado que isto é um caso único que não acontecerá cá.
Ainda nem no Chipre foi decidido o grau desta taxa e já se especula o que se poderá passar em Portugal. Tipico dos portugueses que vivem de cenários hipoteticos em vez de viverem do presente e pensar no futuro.