Uma das perguntas fulcrais para conseguir navegar pelo meio das acusações e contra-acusações envolvendo as estatísticas do emprego neste período eleitoral passará por perceber a seguinte pergunta (até mais do que obter a sua resposta): Porque é que à queda do desemprego não corresponde à mesma subida no emprego?
Desemprego e emprego não são simétricos. Não devem ser por isso surpreendentes os últimos dados do INE relativos aos 2º trimestre de 2015 nos quais o desemprego cai em 108 mil indivíduos face ao mesmo período do ano anterior mas em que, destes, haja mais de 40 mil que não tenham passado a engrossar os números do emprego.
Há toda uma panóplia de situações alternativas que podem caracterizar um indivíduo, que são relevantes para as estatísticas e não passam por esta dicotomia: ou é desempregado ou é empregado. Por outro lado, há ainda a questão da qualidade do emprego e mesmo do conceito do emprego, nem a primeira, nem a segunda são necessariamente fixas no tempo.
Quanto à qualidade veja-se, por exemplo, e é mesmo apenas um de vários exemplos de indicadores possíveis, que face há exatamente quatro anos, os dados do subemprego [Conjunto de trabalhadores, a tempo parcial e com idades dos 15 aos 74 anos que, no período de referência, declararam pretender trabalhar mais horas do que as que habitualmente trabalhavam em todas as atividades e estavam disponíveis para começar a trabalhar as horas pretendidas num período específico (o período de referência ou as duas semanas seguintes).] passaram de 174,8 mil para 242,8 mil. Fora do âmbito das estatísticas do emprego do INE, temos a evolução do salário médio que se tem degradado.
Quanto à segunda, a definição do emprego, o critério de inclusão ou não de alguns programas ocupacionais, estágios e contratos suportados pelo Estado nas estatísticas do emprego não permaneceu fixo o que pode por si distorcer algumas comparações mais apressadas.
Mas voltemos à pergunta: Porque é que à queda do desemprego não corresponde à mesma subida no emprego?
Desde logo só pode ser empregado ou desempregado quem pertence a população ativa. Todos os que sejam classificados como inativos não entram nestas contas mas, atenção, os inativos não são um grupo estático. Um ativo pode, de um dia para o outro passar para o grupo dos inativos e vice-versa o que nos dá logo aqui uma das principais informações pelas quais devemos ter cautela quando centramos a análise, por exemplo, apenas num indicador como a taxa de desemprego ou de emprego. Uma criança faz parte da população inativa. Um adulto desempregado que tenha desistido de procurar emprego (ou que por algumas semanas tenha desistido de o fazer – pode estar doente, por exemplo) também é um inativo. Neste último exemplo, constata-se que se pode passar de desempregado a inativo facilmente. Do mesmo modo, se um desempregado voltar a procurar emprego pode voltar a engrossar a população desempregada de imediato.
Pode também acontecer que um individuo que não tinha emprego nem o procurasse (um inativo) o encontre/seja convidado/o crie e aqui podemos ter estudantes que deixaram de o ser ou um dos tais adultos desencorajados que regressaram à atividade. Um indivíduo que nasça/morra, também afeta a população ativa/inativa, naturalmente. Tal como aqueles que entram na idade de trabalhar o podem fazer. Se o saldo entre os que morrem e os que chegam aos 15 anos teroricamente já em condições de trabalhar tiver uma tendência definida, ao fim de alguns anos isso fará uma diferença significativa alterando-se a relação entre a população ativa e inativa ou alterando a própria composição emprego/desemprego. Por exemplo, se a taxa de desemprego for particularmente diferente no grupo dos jovens face ao dos idosos, o efeito por ser muito relevante. Estes são apenas alguns exemplos que complicam a análise e que devem ser tidos em conta.
Outros igualmente relevantes em especial nos últimos anos serão os movimentos migratórios, quer de emigração permanente declarada (os que afirmam ir fixar residência noutro país), quer os emigrantes temporários (que afirmam contar não estar mais de seis meses no estrangeiro a trabalhar). Segundo o INE, estes númerso aumentaram significativamente entre 2011 e 2014, fixando valores máximos de saídas em 2014. Uma realidade que por si ajuda a explicar a divergência acumulada entre o contingente de desempregados e a dos empregados. Enquanto que no desemprego, segundo a definição atual, houve uma quebra de desempregados, nos empregados há ainda cerca de 313 mil postos de trabalho a menos do que há 4 anos.
Como se vê, há números para vários tipos de aproveitamento político e, havendo uma motivação particularmente preguiçosa podem-nos levar a olhar só para um ou outro indicador. Mas a preguiça por vezes é má conselheira. Não há nada como olhar para a informação rica que o INE nos oferece, sem prejuízo de a complementar com dados e indicadores adicionais que sintetizam essa mesma informação de forma mais completa.
Hoje temos um desemprego a cair incentivado por políticas ativas de emprego e estimulado por uma fase positiva do ciclo económico. Há também sinais claros quanto à qualidade do emprego. A qualidade em geral, face a 2011, registou uma forte degradação (via salário médio, reforço do peso do subemprego), mas sobre a qual há sinais de melhoria nos tempos mais recentes. Por fim, temos o emprego a registar ainda um nível historicamente baixo, com uma destruição líquida acumulada de algumas centenas de milhar de postos cuja recuperação ao ritmo atual de criação líquida de emprego deverá demorar bem mais do que uma legislatura.