Conhecidos que são os resultados das legislativas de 2015 e numa altura em que as opiniões se parecem dividir entre quem pensava que estava a eleger um primeiro-ministro e entre quem pensava estar a votar em deputados para constituir o parlamento, vale a pena fazer um exercício que compara os atuais resultados com alternativas mais simples de atribuição de mandatos para os mesmo exatos votos expressos: o círculo nacional e a distribuição estritamente proporcional de mandatos.
Antes de mais convém recordar que em Portugal, apesar de os deputados receberem um mandato de representação nacional (à luz do que diz a constituição), este concorrem por 22 círculos eleitorais distintos, existindo assim vinte de duas listas distintas e 22 apuramentos de atribuição de mandatos. Não há, portanto, um círculo nacional no qual se somam votos para definir o vencedor, mas 22 eleições distintas no apuramento das quais se usa o método de Hondt para distribuir os mandatos. Nas últimas eleições, na prática, apenas os eleitores de Lisboa puderam votar diretamente nos dois principais auto-proclamados candidatos a primeiro-ministro (Pedro Passos Coelho e António Costa). E note-se que nem todos os líderes partidários escolheram concorrer por Lisboa.
Ou seja, apesar de os deputados não deverem representar regiões ou distritos, na prática, acabam por ser escolhido seguindo uma forma de representação territorial por via dos círculos definidos. Se os deputados seguem ou não essa lógica regionalista ou territorial no exercício do mandato dependerá de cada caso.
Mas voltemos aos círculos, em cada um destes círculos – que no continente correspondem aos distritos -, são atribuídos mandatos de acordo com os eleitores recenseados o que produz círculos com dimensões extremamente díspares: desde os dois deputados em Portalegre, Europa ou Fora da Europa até aos 47 deputados em Lisboa.
Muito mais do que o método de Hondt que, por definição, favorece os partidos mais votados facilitando a formação de maiorias, é a composição dispare de círculos com vários círculos de muito pequena dimensão (há 12 círculos com seis ou menos mandatos) que mais distorção introduz na distorção de mandatos entre o que resultaria de um votação proporcional e aquilo que resulta no final da contagem por círculos combinada com o método de Hondt.
Mas quão dispar pode ser a diferença?
Uma forma de nos aproximarmos de números clarificadores é assumir que os votos expressos no passado dia 4 de outubro de 2015, em vez de estarem distribuídos por 22 círculos com entre 2 a 47 mandatos estariam concentrados num único círculo nacional com 230 mandatos. O esforço estamos em crer que é honesto mas é, note-se, uma aproximação grosseira dado que não podemos ter a certeza de que a votação não se alteraria nesta circunstância.
O que fizemos foi então considerar a soma de votos a nível global e aplicar o método de Hondt ao círculo virtual nacional de 230 deputados. Note-se que somámos aos votos da PAF os votos do PSD e do CDS relativos às Regiões Autónomas onde não existiu coligação. Adicionalmente também fizemos o exercício de distribuição de mandatos no mesmo círculo nacional mas de forma estritamente proporcional (sem o método de hondt), atribuindo o último mandato a quem arredonda pelo maior valor, em percentagem de votos.
Eis os três gráficos e a tabela a que chegámos:
Dito isto uma palavra sobre o método de Hondt. Este método, como já dissemos, favorece a constituição de maiorias absolutas, contudo tem as costas largas quanto à responsabilidade relativa à distorção da proporcionalidade. Como vimos, alterando a composição dos círculos de 22 com dimensões muito variadas para um único de 230 e mantendo o método de Hondt como o que atribui deputados nesse de 230, o resultado aproximou-se consideravelmente da uma pura distribuição proporcional.
E quanto a interpretação dos resultados num cenário como de 2015?
Uma última nota para destacar que, se tivéssemos um círculo nacional para a votação expressa no início de outubro, a principal alteração no parlamento iria no sentido de o vencedor (aquele que teve mais votos quando comparado isoladamente com cada um dos restantes) surgir com uma maioria relativa muito menos folgada. A PAF teria menos 12 deputados (95), o PS menos 6 deputados (80), o Bloco de Esquerda mais 6 (25) a CDU mais 3 deputados (20), o PAN mais dois (3) e surgiriam mais cinco partidos no parlamento, dois deles com um grupo parlamentar de dois deputados.
E em termos de governabilidade?
O PSD não teria o maior grupo parlamentar, o CDS teria apenas o quinto grupo parlamentar, mas a PAF em conjunto continuaria a ter mais deputados. Contudo, quer uma aliança entre PS e BE ou entre PS e CDU superariam em número de mandatos a soma de deputados da PAF.
A PAF para formar uma maioria absoluta politicamente viável continuaria a ter de se aliar ao PS e o PS para conseguir uma maioria absoluta continuaria a ter de contar com uma aliança entre si e o BE e a CDU conjunto.
Curiosamente, se PS e BE se aliassem e formassem uma improvável coligação com os restante seis novos partidos (10 deputados) somariam exatamente 115 deputados, ainda assim insuficientes para uma maioria absoluta.
Em suma, haveria algumas alterações no sentido de reforçar a força de uma coligação de esquerda em termos de mandatos mas, nestas eleições, no final, o problema político de fundo continuaria a ser muito parecido com o que temos hoje na realidade. Teríamos ainda uma duplicação do número de partidos representados no parlamento.
Sobre estas temáticas – ainda que com uma leitura algo enviesada dos “culpados” recomendamos o artigo do Expresso: 762 mil votos não contaram para eleger deputados.
ADENDA: É possível que juntando os votos do AGIR ao PTP com quem não concorreu coligado nas regiões autónomas pudesse ainda haver um outro partido no cenário de círculo nacional (método de Hondt), com prejuízo em um deputado para o PS.
Como é que podem afirmar isto: «O PSD não teria o maior grupo parlamentar, o CDS teria apenas o quinto grupo parlamentar»? Numa situação em que houvesse apenas um único círculo eleitoral, haveria apenas uma lista ordenada de candidatos (em vez das actuais 22) por partido ou coligação. Os tamanhos dos grupos parlamentares do PSD e do CDS dependeriam da forma como essa lista fosse construída, coisa que não sabemos, pois estamos a imaginar uma lista nacional única, não a trabalhar com uma situação de facto.
Já agora, numa situação real, o PSD e o PS perderiam ainda mais votos e mandatos, pois muito voto útil nos pequenos círculos eleitorais actuais (votar CDU ou BE em Bragança é deitar o voto ao “lixo”…) deixaria de existir.
O exercício é hipotético, naturalmente, como aliás sublinhamos e as suas observações, Fernando, são inteiramente pertinentes. Para “fundamentarmos” a afirmação partimos do princípio que PSD e CDS seguiriam o mesmo critério que usaram de hierarquização de lugares em lista onde concorreram coligados. Ora o CDS teve 18 deputados em 107 o que num universo de 95 lhes daria 16 e ao PSD 79. O PS teria 80.
Na analise de apenas um círculo nacional deveriam ser considerados os votos brancos elegendo esses votos cadeiras vazias no parlamento. Os votos branco corresponde aos eleitores que acreditam na democracia, na força dos votos mas não nos candidatos apresentados.
Ao “eleger” cadeiras vazias estávamos de facto a dar ao parlamento representação correta da vontade dos eleitores.
Apenas depois se deve discutir o método de apuramento dos resultados, o proporcional , o de Hondt ou outro
Como as minhas ideias nunca chegaram a lado nenhum, porque sou anónimo e também não filiado em nenhum partido aqui as deixo para a eventualidade de alguém as querer aproveitar:
-1º De facto devia haver só um circulo em todo o país, com excepção dos emigrantes que formariam outro.
-2º O método de contagem devia ser o directo, simples proporcional, isto é deixaríamos o método de Hondt.
-3º a) se o partido vencedor tivesse 25% do total de votos e pelo menos, 5% a mais de votos que o 2º partido mais votado, então seriam atribuídos ao partido vencedor o nº necessário de deputados em falta para obter a maioria absoluta, e os restantes lugares seriam repartidos de forma aritmética simples proporcional.
-3 b) se o partido mais votado não obtivesse pelo menos 25% do total de votos ou se obtendo 25%, não obtivesse uma diferença para o 2º de pelo menos 5%, então haveria uma 2ª volta no 4º Domingo seguinte, só entre os partido que ficaram em 1º e 2º lugar.
4º O actual numero exagerado de deputados seria reduzido a 180.