O PIB português cresceu no primeiro trimestre de 2014 à taxa homóloga de 1,4% a mais elevada desde o final de 2013. Este é o sexto trimestre consecutivo de crescimento económico. Ainda assim o crescimento agora registado além de ficar aquém das expectativas da generalidade dos analistas (os consultados pelo Negócios antecipavam um crescimento entre 1,4% a 2,1%, tendo portanto ficado na margem inferior do intervalo) fica também ligeiramente abaixo das Projeções macroeconómicas para Portugal em 2015 feitas pelo governo aquando da elaboração do Orçamento do Estado .
Mas porque estariam os analistas tão mais otimistas face ao crescimento do PIB e porque é que ele não evoluiu de forma mais robusta?
De facto, a conjuntura económica internacional não é tão favorável há muitos anos:
- Quer por via da estabilização financeira e forte incentivo dado pelo Banco central Europeu que está a injetar um volume significativo de dinheiro na economia europeia, reduzindo, por exemplo, o custo da emissão de dívida (e de renegociação) para níveis nominais historicamente baixos,
- Quer por via da queda abrupta e continuada das taxa de câmbio envolvendo o euro, em boa parte também incentivada pela BCE e que embarateceu significativamente os preços das nossas exportações quer fora da Zona Euro, quer quando em competição dentro da Zona Euro com fornecedores externos a esta.,
- Quer pelo esmagamento dos preços do petróleo, um produto que habitualmente contribui para o desequilíbrio das contas de Portugal,
- Quer porque há crescimento económico significativo entre os nossos principais parceiros (como a Espanha) que mais do que devia compensar a travagem entre os nossos parceiros atingidos pela queda do preço de petróleo (como Angola);
- Quer porque havia a expectativa de a nossa economia estar em condições, depois de um processo que se acreditava virtuoso de reformas estruturais, de vir a surfar esta onda positiva do ciclo económico recuperando algum do atraso face aos seus principais parceiros como está a conseguir fazer, por exemplo, a Espanha.
Perante esta conjuntura pouco menos do que inédita pela conjugação simultânea destes fatores, é natural que os modelos macroeconómicos, por exemplo do Núcleo de Estudos sobre a Conjuntura da Economia Portuguesa antecipassem um crescimento da economia portuguesa da ordem (ou mesmo acima) dos dois pontos percentuais, como aliás antecipou o próprio Presidente da República. E é aqui que este crescimento acaba por revelar alguma frustração. Algo que é particularmente preocupante quando, mais uma vez vemos a economia portuguesa a crescer a metade do ritmo da espanhola (2,6% versus 1,4% em homólogas e 0,9% versus 0,4% em cadeia, para Espanha e Portugal respetivamente).
Por outro lado, o INE avança com algum detalhe – ainda limitado nestas estimativas rápidas – para justificar este crescimento de 1,4% que não autorizam mais do que um otimismo moderado. O dado mais positivo virá da evolução da procura externa com as exportações a acelerarem e com as importações a abrandarem, mas mesmo quanto a este número o INE destaca que esta evolução se deve precisamente à queda do preço do petróleo que alterou os termos de troca o que tem um impacto favorável na balança entre exportações e importações. Note-se ainda que há algum efeito de base nas exportações por via do período em que a refinaria de Sines esteve fechada em 2014 para reparações, ou seja, no primeiro e no segundo trimestre de 2015 as estatísticas registarão por esse efeito um forte crescimento das exportações de combustíveis que mais não são do que a reposição de um situação normal em anos anteriores a 2014 pelo que para registarmos um claro crescimento das exportações que passa ser imputado à evolução estrutural da nossa economia os seus números deveriam ser francamente elevados. Na realidade seria de esperar que à queda das taxas de câmbio e dos custos de produção por via da queda do preço dos combustíveis/energia se juntasse um aumento das exportações que também estivesse relacionado com um aumento das quantidades efetivamente vendidas, ou seja, com um ganho de mercado no exterior, algo que para já não parece ser o principal motor das exportações, em particular das exportações de bens, o que, face à atual fase do ciclo económico e à conjuntura já descrita, é um sinal de forte preocupação para o futuro próximo.
Mas o INE avança ainda com outras razões para o crescimento do PIB, uma delas é o crescimento do consumo privado que continua pujante ainda que mitigado por acertos na componente de variação de existências – aparentemente as reservas de petróleo (a existência mais importante entre as seguidas pelo INE numa lógica de contas nacionais trimestrais) serão no início deste ano significativamente inferiores às do primeiro trimestre de 2014.
Como última nota, o INE informa que com a informação adicional, o crescimento homólogo no quarto trimestre de 2014 foi revisto em baixa, fixando-se agora nos 0,6%, ou seja menos de uma terça parte do crescimento espanhol em igual período.
Em suma, estes dados do INE sendo boas notícias têm tudo para deixar quem analisa regularmente e numa perspetiva histórica a informação das contas nacionais com uma sensação de frustração e de preocupação. O primeiro e o segundo trimestre de 2015, momentos em que se sentirá de forma clara e muito relevante a evolução extremamente positiva da taxa de câmbio, preço de petróleo e crescimento dos nossos principais parceiros deveria ter tudo para estarmos a registar um ritmo de crescimento francamente superior. O facto de a economia portuguesa estar longe de conseguir acompanhar, por exemplo, aquele que é, destacado, o nosso maior parceiro, um país que passou também por sérior problemas económicos na sequência da crise mundial de 2008, indicia que algo de estrutural pode ter sido afetado na economia portuguesa e que hoje a impede de conseguir aproveitar com o necessário fulgor os melhores momentos do ciclo económico, a tempo de nos colocar numa situação mais favorável na eventualidade do surgimento de uma nova crise. Para já, esse movimento está longe de estar a acontecer.
Para terminarmos com uma nota positiva, destacamos que apesar de estarmos a crescer bem abaixo da Espanha, o crescimento de 1,4% no primeiro trimestre está em linha com o crescimento da União Europeia (para os países que já divulgaram esta estimativa) e mesmo um pouco acima da média para a Zona Euro.