Foi ontem divulgado no sítio do Banco de Portugal um muito significativo estudo onde se analisam os efeitos de políticas de austeridade sobre a economia em cenários “normais” e de “crise. O estudo”“Fiscal multipliers in a small euro area economy: How big can they get in crisis times?” assinado por quatro economistas do Banco de Portugal conclui que o impacto recessivo de um esforço de redução do défice é muito superior ao habitualmente considerado nos modelos macroeconómicos aplicados à economia portuguesa. Na prática, em cenário de crise, se segundo o modelo de equilíbrio geral usado pelo Banco de Portugal, por cada euro a menos de défice a riqueza produzida no país pode cair até dois euros. O anterior ministro das finanças (e a Troika) chegou a defender que o impacto de um euro a menos no défice rondaria os 50 cêntimos a menos no PIB.
Outra conclusão algo surpreendnete é a de que são so cortes na despesa (consumo público) e não o aumento de impostos que mais induzem à queda do PIB, sendo o multiplicado máximo quando a “consolidação fiscal” se faz cortando diretamente a despesa do Estado.
Ou seja, se não nos falham as contas (grosseiras), para que o atual défice publico caia de cerca de 5,5% para 4,5% do PIB em termos reais, o valor nominal do défice tem de cair cerca de 20% (quase dois mil milhões de euros) provocando uma queda do PIB à sua conta que deve superar os 2,2 pontos percentuais. O défice cai mas como provoca uma queda muito acentuado do produto, o peso do défice no produto interno bruto teima em persistir elevado mesmo perante grandes contrações da défice. Esta é uma das principais críticas contra a atual política de austeridade existente pois parece, ela propria, garantir que a economia se afunda a um ritmo demasiado elevado para que a dívida que se acumula possa algum dia vir a ser paga.
Este estudo do banco de Portugal vem na sequência da assunção por parte do FMI de revisões importantes (e no mesmo sentido agora avançado pelo BdP) dos seus multiplicadores fiscais.
Eis um excerto do estudo:
“(…) Results show that contemporaneous fiscal multipliers increase in periods of crisis, though the eeffects are more significant for expenditure-based fiscal consolidations. The government consumption fiscal multiplier, in particular, increases from 1.2 in normal times, to around 2 in crisis times. The eeffects are also more persistent during crisis. These results are to a great extent explained by stronger nominal rigidities, which shift the adjustment from the nominal side to the real side, and by more severe financial frictions, which originate lower net capital accumulation. An higher share of hand-to-mouth households, on the other hand, has nearly no effect on the size of the fiscal multiplier, since asset holders respond to the decline in wealth following the debt reduction much in the same way as hand-to-mouth households respond to the reduction in current income.
In addition, fiscal instruments that generate greater downward in inflationary pressures, such as those related to expenditure-based fiscal consolidations, have their short-run multipliers further magnified during crisis. In fact, the lower the inflationary pressure, the greater the role played by stronger nominal rigidities and by more severe financial frictions.
The former prevents swift adjustments in the price level, originating stronger adjustments from the real side. The latter tends to be associated with larger declines in the price of capital, and therefore in net worth. Consequently, firms are forced to cut back on investment further in order to rebalance their financial position. (…)”
Essas conclusões constituem um óbvio paradoxo. Caso fossem verdadeiras, poderia deduzir-se que a melhor política de redução de défice deve ser sempre feito do lado das receitas (i.e aumentando ainda mais os impostos) ou melhor ainda aumentando o défice pois isso conduziria a um aumento do PIB. Ora a segunda solução foi executada pelos governos do Sócrates e conduziu a um aumento da dívida pública que levou a que o mercado não empreste dinheiro à República. Afinal de contas, quais são as alternativas reais na situação em que o mercado não empresta dinheiro à República?