Estado de Alarme – falta emprego, não falta trabalho

Pela primeira vez em democracia o governo Espanhol decretou o estado de alarme, uma figura prevista na lei espanhola que restringe dramaticamente os direitos individuais vinculando-os ao interesse colectivo. O que provocou a identificação de tal estado? Uma greve não anunciada por parte dos controladores de tráfego aéreo desencadeada de forma concertada em praticamente todo o país.

A violação da lei da greve, o carácter estratégico e fulcral da função daqueles profissionais e, naturalmente, os danos provocados a centenas de milhares de outros cidadãos espanhóis (e não só) levou o governo espanhol a usar de um instrumento legal que poucos adivinhariam vir a ser accionado que não por razões mais relacionadas com catástrofes naturais, acidentes industriais, conflito militar, e outros que tais.

Como reagirá a população espanhola na ressaca deste caso? O facto de os controladores de tráfego aéreo serem dos profissionais mais bem pagos do seu sector entre os seus pares europeus (mais do que Ingleses ou Franceses, por exemplo) talvez não abone muito em favor da simpatia para com eles (no fundo reclamavam contra um aumento do tempo de trabalho sem aumento da remuneração) mas talvez o fundamental desta questão, que poderá conquistar a simpatia de boa parte dos restantes concidadãos em favor da opção do governo, passe pelo genuíno poder de chantagem que algumas, poucas, profissões podem ter sobre o resto da comunidade. Pilotos (aéreos e das barras), maquinistas ferroviários, controladores de tráfego aéreo e marítimo e camionistas são alguns dos profissionais que têm na greve um poder de persuasão e chantagem que não está ao dispor da grande maioria dos restantes. Resta saber se não correm o risco de ser vistos pelo resto da população mais como corporações que usam o poder singular de controlarem uma área sensível de qualquer economia para extorquirem mais do que para pedirem com justiça. Em Espanha, o carácter selvagem da greve deve ter mais a ver com a imensa dificuldade em concretizar o destino expectável de tal acto em qualquer outra profissão – o despedimento sem justa causa e eventuais pedidos de indemnização exigidos aos grevistas – do que com uma especial coragem ou temeridade dos grevistas. Esta greve selvagem e suas consequências inéditas parecem testemunhar que se ultrapassou o que era admissível e uma reacção semi-ditatorial do Estado pode, de facto, revelar-se aceite com aclamação pela população.

Estamos definitivamente a atravessar tempos de excepção, seja na suspensão da segurança no direito quando se aprovam perdas nominais de salários e se reconfiguram “direitos adquiridos”, seja quando percebemos da pior forma que o poder político local foi ultrapassado pelo buraco que também ajudou a criar, convertendo-se em fantoche, seja por aparecem tiques anarquistas entre trabalhadores que têm tudo para se confundirem com fanfarrões, seja ainda quando a integridade do Estado conhece entendimentos políticos diferentes entre o continente e as ilhas. Pode faltar o emprego, mas não nos falta trabalho!

P.S.: Apesar da crítica feita, não hesito em deixar aqui, sobre os controladores do tráfego aéreo espanhóis, o outro lado da história descrito com prespectivas bem distintas por dois controladores:

Deixar uma resposta