Pirataria informática promove crescimento económico

De uma associação que responde pelo nome ASSOFT poder-se-ia pensar que teria cuidado para não chamar os portugueses de burros. Mas foi o que a Assoft tentou na semana passada. O truque é conhecido: uma press release com um argumento absurdo e previamente formatada para servir em copy&paste a redacções sôfregas por mostrar serviço e sem a devida formação  para enviar a press release directamente para o caixote do lixo ou pelo menos indagar por alguém independente que possa verificar ou refutar as alegações. Para maior impacto ensaia-se a defesa do bem comum, neste caso o IVA que o Estado “perdeu”. Com base na última “notícia” da Associação Portuguesa de Software os media produziram artigos com os seguintes títulos:

Os 91,5 referem-se ao IVA que supostamente terão ficado por cobrar à conta do software pitata. Como o leitor já deverá ter percebido tal não corresponde à verdade.

Primeiro, porque se os portugueses que usam software pirata tivessem de pagar pelo software em vez de o obterem gratuitamente teriam comprado uma quantidade consideravelmente menor de software e optado por soluções mais económicas; nada mais elementar que a lei da oferta e da procura. Quem usa o Photoshop pensaria duas vezes antes de desembolsar várias centenas de euros pela licença do programa e poderia muito bem concluir que o Paint Shop Pro serve perfeitamente para as necessidades e custa apenas 20%. Outros dar-se-iam por satisfeitos com software livre, como o Gimp.

Segundo, o dinheiro que os portugueses deixam de gastar para comprar software gastam-no na compra de outros bens ou serviços, sobre os quais incide IVA ou poupam-no, promovendo o investimento.

Sendo o software português ou a componente do produto produzida em Portugal que é pirateado uma percentagem extremamente reduzida do seu preço final, pode-se afirmar que a pirataria informática promove o crescimento económico, via o aumento da despesa e da poupança? Pode ser verdade ou não. O que se pode certamente afirmar é que o título desta entrada faz mais sentido do que as notícias que a Assoft colocou a circular.

Convém não esquecer que, sem pôr em causa a responsabilidades de quem instala e utiliza software não licenciado, estes actos são muitas vezes facilitados pelas próprias empresas do sector, seja pela presença activa nos canais dedicados à pirataria, seja pelo forma acessível como muitas das protecções anti-pirataria podem ser contornadas. Os incentivos das empresas para este aparente tiro no pé são o aumento da quota de mercado, externalidades de rede e o efeito lock-in sobre utilizadores e empregadores. Nas palavras do próprio Steve Ballmer, presidente da Microsoft, “se vai piratear software, ao menos que seja da Microsoft“.

9 comentários

  1. Bravo. Finalmente alguém com percepção da realidade.

    Não terei conhecimento de causa suficiente para esclarecer se “a pirataria informática promove o crescimento económico”, mas certamente que promove o acesso das massas às Tecnologias de Informação.

    Apesar de hoje em dia existirem alternativas (nem sempre completas) grátis para os principais programas existentes, o que não acontecia há não muitos anos atrás, o acesso fácil e barato (ou a custo zero) possibilita que muitos portugueses se consigam educar e formar em ferramentas imprescindíveis, às quais dificilmente teriam acesso caso tivessem de as comprar.

    E esse acesso permite termos uma população mais conhecedora e com mais experiência em TI e, arriscaria dizer, com maiores potenciais de eficiência no mundo empresarial.

  2. Bom artigo. Já discuti imenso acerca deste assunto e o meu ponto de vista incide sempre sobre o mesmo:
    1. Invariavelmente as pessoas gastam o mesmo. Logo, se comprarem software alguma coisa terá de ficar para trás. Conclusão o IVA que caminha para os cofres do Estado é sempre o mesmo;
    2. Alguns destes estudos baseiam-se nas prováveis instalações. Ora, como todos sabemos, exceptuando alguns jornalistas e ASSOFT, a grande maioria destas instalaçõe snão existiria caso fossem compradas. Muitos computadores estão carregados de tralha que nunca são usados. Logo, nunca poderiam contar para a estatística;
    3. Em todo o modo, a pirataria é ilegal. A resposta à ASSOFT só poderá ser dada com a adopção generalizada de software livre e aberto.

    @braço.

  3. Esqueci-me de referir a pressão da pirataria sobre o pricing das empresas – preços/descontos/fornecimento gratuito de software. Se o tivesse feito poderia provavelmente ter dito que provavelmente a pirataria contribui para o crescimento…
    E em matéria de lembretes, tinha visto um artigo do JCD algures no blasfemias, foi de la que colhi a informação sobre a poupança dos individuos. Melhor acrescentar ao artigo antes que me acusem (outra vez ) de plagio… 😉

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