O juro pago nos certificados do tesouro está desalinhado com o mercado?

Na sequência do artigo anterior “Os certificados do tesouro poupança mais são uma ameaça à banca nacional?” prosseguimos e concluímos procurando responder à pergunta:

Está o juro pago nos certificados do tesouro desalinhado com o mercado e com as recomendações do regulador?

O Banco de Portugal tem como referência que os depósitos a prazo possam remunerar, sem penalizações nos rácios de capital, a uma taxa equivalente à soma da taxa de referência associada à maturidade do depósito acrescida de 300 ponto base ou 3 pontos percentuais.

Se assumirmos que a taxa swap do euro a 5 anos é a referência adequada para uma aplicação a 5 anos (ronda presentemente 1%) e lhe juntarmos os 3 pontos percentuais de spread aceite pelo Banco de Portugal, obtemos como referência uma taxa de juro a rondar 4%. Ora este é um valor muito similar aos 4,25% de taxa de juro média para o período de 5 anos dos novos certificados do tesouro poupança mais.

Se juntarmos a isto o facto de o Estado português estar a pagar taxas de juro reais que chegam a superar o 5% em títulos da dívida a 5 anos colocados junto a investidores institucionais (como os bancos) facilmente se percebe que o produto está estruturado de forma equilibrada face às condições de mercado (da perspetiva das referências do regulador) e a haver desequilíbrio este ocorre em desfavor dos pequenos aforradores que continuam a não ter acesso a taxas tão altas quanto as de outros títulos do tesouro orientados para grandes investidores, com a penalização adicional oriunda de uma taxa de IRS de 28% sobre os juros que reverte para o próprio devedor  – o Estado. Uma penalização apurada por comparação com todos os investidores estrangeiros (muitas vezes empresas de grupos financeiros nacionais) que podem reportar os ganhos noutros países com fiscalidade mais leve.

Em suma, é nossa opinião que um sector financeiro saudável pode e deve acomodar de forma permanente uma aplicação de poupança junto dos pequenos aforradores nacionais com as características agora desenhadas. Há várias vantagens importantes, até do ponto de vista da gestão política e económica em ter os residentes como tomadores preferências da dívida pública. Resta saber que opções e reflexões se tomarão face a um momento de ainda frágil saúde, quer do Estado, quer dos bancos nacionais. Para já, a pressão junto da banca nacional para reagir e repensar o seu modelo de negócio é evidente, sendo que este novo produto de poupança do Estado será apenas mais um pequeno contributo para se construir o referencial saudável em função do qual a banca se deve redesenhar.

5 comentários

  1. Caro RCB,

    Apesar de um artigo interessante gostaria de salientar que o Estado não está a pagar 5% (por títulos de divida a 5 anos) – essa taxa é de mercado secundário, a que os investidores institucionais negoceiam as obrigações mencionadas.

    Apesar de ser importante ter um produto competitivo, as taxas oferecidas pelo novo certificado de tesouro são superiores ás taxas de juro previstas pelo FMI e Governo para os próximos cinco anos.

    No fundo, este produto irá prejudicar os orçamentos do estado dos próximos 5 anos apesar de ser uma parte ínfima dos muitos gastos desnecessários do Estado Português.

    Cumprimentos,
    T

    1. Caro Tiago, obrigado pelo seu comentário. Permita-me replicar:
      Os certificados vão pagar líquidos:
      1ºano 1,98
      2ºano 2,34
      3ºano 3,42
      4ºano 3,6
      5ºano 3,6

      Média 2,988

      Dirigindo-se a residentes creio que é este o referencial mais correto a usar dado que 28% da taxa base reverte diretamente para o devedor via IRS. Acha mesmo que, considerando a distribuição da estrutura de taxas ao longo dos 5 anos e a própria taxa média a 5 anos (os tais 2,988%) o Estado está a prejudicar os próximos OE se reforçar o aforro de residentes por esta via?
      Qual é a alterantiva mais económcia que existe neste momento nos mercados? Qual é a taxa de juro de emissões 5 anos em mercado primário?

  2. Tem razao nos seus cálculos. Mas nao se esqueca que para calcular o custo para o Estado tem que ter em conta a liquidez (que custa ao Estado 0,20% p.a.) mais o prémio sobre o crescimento positivo do PIB.

    Nao deixa de ser um produto muito importante, também para evitar investimentos em produtos que prometem “taxas altas sem risco” como se tem visto em Portugal.

    Em relacao á alternativa mais económica nos mercados é óbvio que o Estado Portugues nao pode financiar-se aos níveis actuais, mas pode o Estado Portugues pagar uma taxa média de 2,988% com um PIB potencial de 2%?

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